Russell Brand fala sobre Joker e eu falo sobre Russell


Vocês gostam do Russell Brand? Apareceu nuns filmes, apenas vi o Forgetting..., há uma eternidade, lembro que apresentou premiações. Tem fama como comediante mas nunca vi os seus shows. Sei que foi viciado em cocaína e na Kate Perry. Não correu bem com nenhuma das duas. Não sei se foi ela quem o levou na cantiga, ou se foi ele que a conquistou com o seu humor. O amor é lindo enquanto dura e o amor de Russell não durou muito. Tem bastante êxito no Youtube. É uma das minhas subscrições. Mesmo quando não concordo com ele gosto de o ouvir. É um tipo esperto, quer dizer,  representa a esperteza dos comuns mortais, não propriamente as dos inteligentes ou muito iluminados, é uma voz talvez mais perto das vozes políticas do que de grandes analistas, e tem esta postura inconformista: fala contra o governo, contra o sistema, contra o poder. Quer fazer a revolução e não se televisioná-la, mas, pelo menos, Youtubizá-la.

Neste vídeo ele vem falar de Joker. Entendo perfeitamente que tenha achado o filme brilhante. Sem dúvida que Russell sabe ser um produto para os nossos conturbados tempos, sabe vender bem a sua marca (Brand), assim como Todd Phillips nos soube bem vender o Joker, uma personagem da BD bem antiga. É evidente que Russell tem o dom da palavra, embora nem sempre tenha a certeza se ele aprofunda mesmo os tópicos e acredita no que diz, ou se apenas os lança para o ar na esperança de nos levar na cantiga da melhor forma possível! (Como levou Katy Perry?)

Sempre achei que o Russell era apenas mais uma celebridade, e não muito célebre. Capitalizou bastante quando se tornou marido da Katy Perry. Não tenho simpatia pela cantora, por sinal bem querida em Portugal, sempre um coração de manteiga para as estrelas internacionais que tenham no mínimo uma lente de contacto fabricada em Portugal colada a um olho. Katy Perry tem mais que uma lente. Ela costuma mencionar que tem ascendência portuguesa. O mundo inteiro sabe que o tetravô dela era dos Açores, que é Portugal. Costuma gabar-se de falar um pouco de português - duas ou três frases, do tipo Obrigada!, Público maravilhoso! Gosto de estar aqui! e pouco mais - e de até ser um bocadinho portuguesa. Não sei porquê, mas tanta fofice não resulta comigo e continuo sem lhe achar piada alguma, ou à sua música, preferindo o infame ex, que lhe comunicou por SMS que se ia divorciar dela, e que renunciou a 50% do património dela, a que tinha direito. Não faço ideia sobre as culpas de cada um no cartório do matrimónio , mas a vida seguiu. Em 2018, a cantora liderava a lista das mulheres mais bem pagas do mundo da música, feita pela revista Forbes. Katy Perry acaba de lançar seu novo single,"Harleys In Hawaii", que não consegui ouvir até final, que me desculpem os fãs, mas é totalmente enfadonho.

Há muito que anda por aí uma história - que já agora aproveito para contar aqui -  sobre a casita de sonho de Perry, nada mais, nada menos que um convento, Los Feliz, que pertenceu à Ordem das Irmãs do Imaculado Coração de Maria e que antes disso pertenceu a Sir Daniel J.  e à Condessa Bernardine, e depois a Murphy Donohue. As freiras, ou melhor, uma das últimas residentes ali, não aceitou que ela pudesse vir a habitar o chão que elas outrora pisaram e afirmava que a Perry tinha sangue nas mãos. Isto foi quanto bastou para eu querer averiguar o crime, qual Miss Marple.  Quem estava a gostar da perspectiva de negócio era a arquidiocese: Perry oferecia uma pipa de massa. Reza a história que, nos anos 70, as freiras compraram a casa a um negociante, Daniel Donohue. Em 2011 a arquidiocese forçou as últimas das 50 a deixar a propriedade, possivelmente, já com planos de venda em mente.


Primeiro, as freiras nem sabiam quem Perry era, mas o Google é amigo. E foi assim que encontraram um vídeo onde ela dizia ter vendido a alma ao diabo em troco de fama. Perry era um símbolo de tudo o que as freiras consideravam iníquo, mas, mesmo assim, aceitaram um encontro com ela, que lhes cantou o Gospel Oh Happy Day e lhes mostrou uma tatuagem que possui no pulso com a palavra Jesus. Elas até a moça acharam simpática mas, convencidas de que tinham poderes para negociar, preferiram vender a outra pessoa. A compradora mudou-se para a mansão. Queria trasnformar o  convento num hotel boutique e as freiras gostaram da ideia da propriedade, no futuro, vir a ser aberta ao público (embora não um qualquer, não é?) e não transformada num bem privado. Tudo um céu de rosas, mas a arquidiocese e Perry não acharam graça à iniciativa e processaram as freiras. O tribunal invalidou a compra da empresária dando razão à arquidiocese. Mais tarde ela foi condenada a indemnizar Perry e abriu falência.  Perry processou a empresária por interferir no negócio e por se ter aproveitado das freiras. Parecia então que Perry ainda poderia habitar o convento mas só se a arquidiocese aceitasse...e o Papa! O Papa, em 2017, deu o seu aval mas apenas na condição de Perry encontrar lugar para as freiras. Em 2018, a batalha legal da empresária, o processo de falência, continuava no tribunal e uma das freiras colapsou e morreu enquanto manifestava o seu apoio à senhora. E é daqui que vem o tal dramático sangue nas mãos de Perry de que a freira falava. E o convento está de novo à venda! Imagino que Perry esteja à espera que as freiras vão para o céu, já que assim não terá de se preocupar com o seu realojamento. Não sei se Brand já fez uma "review" deste filme, o argumento é apelativo, afinal existem os poderosos de um lado, e os oprimidos do outro.

Nesta crítica que ele faz do Joker não há nada que não subscreva e, aliás, muito do que ele diz até foi também por mim escrito na minha abordagem sobre o filme, escrita aqui. Não quero com isto dizer que me considere muito clarividente, aliás, o Joker é um filme evidente na sua narrativa, não dá assim tanto trabalho a perceber do que trata. É curioso que Russell refira uma situação passada em Londres, uma morte de um homem que estava detido que depois levou a motins nas ruas, que tinha uma componente económica. As pessoas subsistiram as ideologias que permitiam apaziguar os desejos de consumo pela vertigem consumista e assim não conseguem  assimilar a sua insatisfação, diz ele. A glamourização da violência que o filme faz não é o que justifica o seu apelo e a sua polémica, é antes esta pulsão da voz que ele dá à negligência e aos negligenciados. Uma cultura é despida dos seus valores centrais e então o que sucede? É esta, para Russell a questão que torna o filme tão atractivo para muita gente. A identidade nacional, a identidade em torno de papéis convencionais e tradicionais, as oportunidades económicas que não são providenciadas às pessoas, ou integração social, são ideias que estão presentes no filme. Russell também considera interessante que muita da crítica tenha desprezado o filme ao mesmo tempo que as audiências o acolhem euforicamente. Mais uma vez, a oposição entre "topo" e "base".  Tudo evidências, conforme referi no início, mas que não boca de Russell ganham uma vida que tem atraído muitos seguidores ao seu canal, inclusivé, eu mesma.


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