Sete dezenas de versões da Última Ceia para vocês se ofenderem, ou não

 

Quantas vezes já foi A Última Ceia transfigurada sem que ninguém se tenha sentido ofendido? Tantas que é impossível responder. Esta pintura foi copiada, imitada, parodiada por toda a gente, grandes e pequenos artistas, até por mim, que há uns anos fiz um cartoon sem grande história inspirado nela. Inspirou artistas do Ocidente a usarem de maior humanismo e emoçãodramática  na pintura religiosa. A Última Ceia foi decertoa referência cultural de muitos pintores que a seguire a ela pintaram O Festim dos Deuses, uma reunião de seres mitológicos à roda de mesas, celebrando, festivos, e não atormentados por sentimentos de dúvida, triação, inquietação, como é o caso da Ceia e do momento que a inspira. Se na cerimónia dos Jogos Olímpicos surge uma secção que se intitula "Festividade" onde é que isso podia ser representado pela ceia dos apóstolos, em especial, pela de da Vinci que se fixa no preciso momento em que o profeta Jesus terá levantado a lebre de que entre os convivas havia um que ditaria a sua morte. Aquela mesa não é festiva, aquela mesa é a mesa da traição.

Agora, com a utilização do AI para gerar imagens, o que não faltam são  imensas versões da Última Ceia, a maioria de gosto duvidoso, que qualquer um pode criar sem restrição alguma. A banalização desta importante obra religiosa está ao nível do que vemos acontecer com a imagem da N. Srª de Fátima que tanto está no seu altar, em Fátima, envolta em solenidade, como estampada num insignificante corta-unhas pendurado num chaveiro, transportado na carteira ou no bolso das calças. Mas, por outro, tem sido essa massiva apropriação que tem mantido a pintura muito viva no imaginário colectivo. A Última Ceia lembra-nos fr traição e de sacrifício, mas também de redenção.

Um poster ou uma cópia mais clássica, umas vezes boa outras péssima, existe algures numa parede de uma casa, de muita casa, sobretudo Ocidental, talvez até na sua. Paródias da Última Ceia estão em postagens de blogues e no Facebook, no Twitter, agora X. Aparecem em cenas de séries e de filmes antigos e novos. Fazem vender produtos ou apenas divertem,  decoram desde tapetes de rato, bolsas de levar ao supermercado e à praia, a paredes de escritório. Algumas serão arte, embora distante do original que lhe deu origem. Há uma que é a ideal para si e se achar que não é apenas porque ainda não a encontrou.

A célebre pintura na parede realizada com têmpera e óleo sobre um preparo em gesso, ao contrário da técnica de afresco normalmente utilizada naquela época, pelo mestre Leonard Da Vinci, foi patrocinada por Ludovico Sforza, Duque de Milão.  Naquele tempo era quase obrigatório que nos refeitórios dos mosteiros existisse uma pintura da Ceia, era uma forma dos religiosos comungarem daquele momento. Criada de 1494 a 1498 para o refeitório do convento dominicano de Santa Maria Delle Grazie, em Milão,  encontra-se em más condições em resultado do decurso do tempo, da humidade, más restaurações, também fruto dos azares históricos que a apanharam no caminho, as invasões napoleónicas e a II Grande Guerra. Também conhecida por Santa Ceia, representa o momento bíblico em que Cristo compartilha sua última refeição com os discípulos. O instante mostrado na pintura é aquele em que Jesus acaba de afirmar que "um de vós me há-de trair", e os discípulos estarão perguntando "Sou eu, Senhor?"Sabemos isso porque se nota uma certa agitação nas figuras representadas, cada uma expressando de forma diferente o seu desconforto, que contrasta com o ar apaziguado de Jesus. É uma grande obra religiosa, ao seu tempo uma verdadeira inovação técnica, que fascinou e continua a fascinar. No livro "Segredo dos Templários" de Clive Prince e Lynn Picknett e no romance "O Código da Vinci" de Dan Brown, afirma-se que a figura imberbe à direita de Jesus não é o apóstolo João e antes uma figura feminina. É uma teoria, uma especulação, pois considera-se que provavelmente será São João Evangelista, representado de forma andrógina, de género indefinido, uma característica da pintura de Leonardo.

Muitos ofendidos têm lançado a questão: Porque é que eles não gozam antes com Maomé? É uma pergunta reveladora. "Eles", é claro, são aqueles que os primeiros consideram inferiores, doentes, aberrações, indignos e pecaminosos, sejam drags, ou trans, ou, possivelmente gays, como também se diz que da Vinci foi, enfim, tudo o que seja diferente deles, tudo o que lhes cause desconforto, e, porque não, inspire receio, é desprezível e devia desaparecer. Mas, se gozarem com Maomé já não haverá problema, é isso? Não, não é isso. Supostament edeviam recear a vingança dos crentes islâmicos. É que uma facção extremista e criminosa do Islão demonstrou em Paris que não tolera brincadeiras, o humor, a sátira, que envolva a figura do seu profeta. No entanto, quando os artistas da Charlie Hebdo foram mortos por fazerem imagens de Maomé, o que seria proibido, um Imã de Ceuta veio dizer uma coisa muito interessante, que podem ler aqui, Deus é suficientemente grande para defender ele mesmo o Profeta. Adiantou ele que existem fontes no Islão que defendem a liberdade de expressão e quer os estudiosos da teologia muçulmana, quer os jurisconsultos do direito muçulmano sabem perfeitamente que o espírito de vingança não faz parte dos seus ensinamentos. E ainda que o objectivo da Liberdade é que todo o mundo tem o direito de crer ou não, de criticar ou não, assim como eles, muçulmanos, têm o direito de aprovar ou desaprovar, e é essa a beleza da Democracia, é essa a grandeza da Republica (de França) da qual eles, muçulmanos hoje fazem parte. Deus quis a misericórdia para o mundo, não precisa de ser defendido, deus é grande, (Allahu akbar), suficientemente grande para defender ele mesmo o seu profeta, e eles, muçulmanos, devem dar o exemplo, porque são seus discípulos, discípulos de tolerância, de indulgência, mas também de liberdade de consciência e de crença. Com isto quero dizer que nem todo o Islão se revê nessa vingança bruta perpetrada em Paris. Nem NÓS devíamos continuar a usar a memória dessa vingança levada a cabo por um grupo de criminosos para defender o nosso incómodo perante o exercício do humor em torno de motivos da cristandade porque é um argumento vazio. 

Além disso, não há qualquer indício anterior desta desaprovação pelo uso da Última Ceia, pois, como poderão ver ao longo dos exemplos que vos mostro, se alguns são perfeitamente inocentes, outros podem ser facilmente rotulados de mau gosto e até ofensivos. À excepção da Ceia que Bordalo Pinheiro desenhou, não encontrei mais nenhum caso em que tivessem sido movidos processos judiciais. Estas imagens chegam hoje a todo o lugar por via da ampla difusão que a internet promove. Não há reacções assinaláveis por parte da Cristandade, nem do crente nem das altas instâncias teológicas, nem mesmo na recente apropriação que os seguidores de Trump fazem da figura de Jesus Cristo, algo que a mim, por exemplo, me deixa bastante crispada. A impressão que dá é que o valor da Santa Ceia é o mesmo de um desenho do Snoopy, uma imagem perfeitamente desprovidade de qualquer sacralidade.

Saramago escreveu, qualquer coisa como, “perguntaram-me como pode um homem sem religião ser bom ao que respondi como pode um homem com religião ser mau”. Ao escrever estas linhas não quero dizer que todos tenhamos de gostar do que vimos. Mas poderemos concordar que é possível desaprovar algo, o que quer que seja, sem ser odioso? A DJ Barbara Butch, a disc jockey e activista lésbica francesa, a gordinha coroada que ocupava o lugar central na mesa, disse que sofreu uma torrente de ameaças online e resolveu proceder legalmente. Pois faz bem. Qual a necessidade de recorrer ao assédio online, a ameaças de morte e insultos contra alguém? Se parte dos cristãos se sentiram gozados, ou o seu salvador, estão no seu direito. Mas parecem ter convenientemente ignorado que "Eles"- drags, trans, gays, etc - também podem professar a religião cristã. Onde fica o tal "amai-vos uns aos outros, o condene-se o pecado mas não o pecador, etc?!! O sucedido mostra muita hipocrisia da parte de quem se apregoa superiormente moral, mas, afinal, apenas em teoria, porque, na prática, o que se vê é isto: amigo, se não é igual a mim, devias arder na fogueira, meu pecador transviado.

O quadro intitulado por Thomas Jolly "Festividade" foi por uns entendido como uma evocação do fresco A Última Ceia, de Leonardo da Vinci, nome da refeição que Cristo compartilhou com seus apóstolos na véspera de sua crucificação. Se por um lado se trata de um momento familiar para qualquer cristão que vai à missa, é necessário algum distanciamento: o que foi apropriado foi a recriação do pintor Leonardo da Vinci, a sua visão, desse momento ocorrido há mais de 2000 anos. Creio que as imagens para os católicos não são Deus nem podem ser adoradas, podem ser apenas objecto de devoção. São meras representações, gessos, madeiras, pedras esculpidas. São, pois um atributo secundário daquilo que realmente importa: a fé. Podem ser arte religiosa, ter muito valor por isso mesmo, com o tempo vim a apreciar bastante e tive a felicidade de poder maravilhar-me com grandes obras, aqui em Portugal e na Europa. As imagens podem ser úteis como símbolos mas até podia não existir uma única e isso não significaria a extinção da fé nem da religião. Não vejo, por isso, razão para não brincar com a Última Ceia, uma representação, ela é a visão de um homem talentoso, um artista sobre o tema, e, parece, que gay, de acordo com muitas opiniões da Vinci seria homossexual. Já agora, sexo homossexual é errado por não gerar vida mas ser gay não é pecado. Creio que é isso que a Igreja proclama. Ora, parece que fazer uma performance teatral não só foi um pecado para muitos como uma transgressão que merece ameaças de morte. Infelizmente não conseguirei nunca levar a sério alguém que me diga que vai boicotar os Jogos porque a cerimónia estava cheia de imagens demoníacas. É chocante. Até parece que voltámos à Idade Média! Já agora, pelo sim pelo não, não vejam a Cerimónia de Encerramento e poupem o mundo a mais manifestações de ódio, sim? Paz e amor.


Frida Khalo - A última ceia

Série de TV Battlestar Gallactica

Auchard - estrelas da música

Ricky e Morty, desenhos animados

Um cartoon de David Rowe

Farcry 5, playstation
The Sopranos Last Supper for Vanity Fair magazine
Versão South Park
A Santa Ceia da Turma do Mickey e Pateta!
A turma do Popeye
Versão clássicos do cinema com ET ao centro
David Lachapelle
Versão vídeo-games, Mario, Sonic e companhia
Versão Romero Brito
Star Wars
Seiya - Manga japonesa

A Turma da Mónica, de Maurício de Souza

Série TV Lost
Versão Ariana Grande
Versão Pokémon
Os Mercenários
A versão Lego

O Street Fighter na Santa Ceia
Versão Os Simpsons

 Tv Série Dr. House
Paródia a Trump

Danny Byrne - The First Last Fast Food Supper.


The Watchmen - Série de TV

Filme MASH
Last Supper at The White House (Richard Nixon) 1970
Brian's Life filme
La Cène de Léonard de Vinci, photographiée par Philippe Lucchese

Versão Salvador Dali
Um cartoon
Serie TV Rwin Peaks
Dina Goldstein

Viridiana, filme de Bunnuel

Sabine Ott
Membros do politburo da Bulgária, antigo Partido Comunista Búlgaro 
e o ditador Todor Zhivkov como Jesus 
Cães, para os amantes de animais
Popeye e companhia
Estrelas da música por Leigh Banks
Bolsonaro ao centro
Who Gets the Check? - Winston Smith
Einstein e cientistas
MacDondald's e mais marcas
Mickey e vários desenhos animados
Trump e outros políticos
Filme The big Lebowskie
Paródia feita durante o Covid

Mais uma do Trump, possivelmente gerada com AI
Peça de teatro?
Poster afro americano
Jesus na noite de Halloween

De Richard Mudariki
Para quem gosta de gatos, possivelmente gerada com AI
The Greatest Movie Ever Sold (2011), de Morgan Spurlock.
Trump e companhia
De novo o filme The big Lebowski
Universo Van Gogh
Jim Morrison e outros artistas da cena musical

Actores e actrizes de Hollywood
Sobieski
Os Estrumpfes


E um exemplo nacional, para terminar. A "Última Ceia" humorística inspirada em Leonardo da Vinci, criada por Bordallo.  Tendo o Zé Povinho, atormentado por impostos,  como Jesus Cristo e os apostolos como os membros do partido regenerador ( a esquerda) e do partido progressista (à direita);Zé Povinho figura ao centro como Cristo, que lhos servem numa bandeja. À sua esquerda, o conselheiro Arrobas e por figuras da oposição, nomeadamente Manuel de Arriaga, Barros Gomes, Mariano de Carvalho e Braamcamp. À sua direita, o rei D. Luís (S. Pedro) e o financeiro Burnay, além dos políticos Serpa Pimentel, Fontes Pereira de Melo (chefe do governo, na posição de Judas), Barros e Sá, José Dias Ferreira. Esta gravura valeu a Bordalo um processo judicial.


A ceia de António é a reacção de Bordalo ao processo judicial que lhe foi movido por ter tido a audácia de ter desenhado a Ceia de Zé (imagem anterior). Absolvido em tribunal, o caricaturista volta ao papel e e desta vez ocupa ele o lugar de Cristo como vítima e é ladeado pelas figuras ligadas ao julgamento, no tribunal da Boa-Hora.  Bordalo reagia à censura e defendia a liberdade de expressão, respondia com inteligência e finura, na melhor moeda.

Palhaços da cultura popular
Fotógrafa Elisabeth Olsen Watson
 Folsom Street Fair - fotógrafo desconhecido
altany the last snack
Chefe Ramsey
Ron English's Last Supper Icons, 2011
Uma ceia Zombie
Universo do Hip Hop
 Estrelas do Rock n' Roll 

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