João Baptista, um pai sem maneiras


Minha gente: confesso. Não conheço a maior parte dos actores e actrizes portuguesas. Os que ainda me dizem alguma coisa são os que participaram em filmes menos recentes, pois até final dos anos 90 via bastante cinema português. Actores e actrizes de novelas, - que não vejo desde a Gabriela! - conheço apenas um ou outro, que transitaram do grande para o pequeno ecrã, e alguns de teatro. Tenho algumas preferências, ainda assim, embora não profundamente fundamentadas, coisa de alguns episódios isolados de novelas ou séries vistos ao acaso, ou uma ou outra peça de teatro.  Se por acaso leio notícias com nomes de actores e actrizes portuguesas, a maioria das vezes não sei quem são. São apenas caras desconhecidas que se confundem com influencers e outras "celebritites" em feeds sem grande relevância. É quase vergonhoso, assumo, face à quantidade de actores e actrizes estrangeiros cujo trabalho conheço bastante bem. O trabalho, não a fofoquice. Para essa não tenho nem tempo nem interesse. Assim sendo, é claro que não fazia a mínima ideia de quem fosse o actor João Baptista, um tal que fez um vídeo polémico onde diz , "Oh cabeça de merda, já não te disse que não se mexe nas coisas do pai? Larga. Teimosa, pá", a repreender a filha que tem...dois anos de idade. 

O que dizer? Não, não me surpreende o tratamento inadequado pois já ouvi coisas semelhantes, sobretudo na praia, que é o local onde mais vezes observo famílias descontraídas, pais ou mães, com a sua prole. A educação foi com os porcos, eis a crua realidade. Não sei se a educação se despenhou no mar,  como os porcos carregando os demónios, creio mais numa erosão continuada e palatina a que fomos assistindo como se assiste à erosão costeira. Já não há respeito, ouve-se dizer aos mais velhos. E agora até eu que vou a caminho de ser tão velha como os mais velhos, tenho de dar a mão à palmatória e constatar que cada vez menos se respeita o nosso semelhante. O respeito que dantes era um manto que enobrecia quem o usasse, hoje não passa de uma manta de retalhos, puída e esburacada, que parece não enriquecer ninguém que se dê ao trabalho de a esticar sobre os ombros.

Houve um tempo em que um pai teria vergonha de tratar assim uma filha, pelo menos em público, fosse bebé, adolescente ou adulta. Em privado, seria outra história. Bem sabemos que entre quatro paredes a vida não é cor-de-rosa ou ideal e que muitas crianças sofreram - e sofrem - às mãos de familiares diversas qualidades de abusos. Mas ser educado, hoje, ser educado, respeitar os outros - e o respeito é devido em todas as idades -  e respeitar-se, não é mais nada que se valorize. Notem que este tratamento indigno não significa que o João não seja afectuoso com a filha, ou que lhe falte com outras coisas essenciais, em suma, que seja uma completa ruina de pai. Disso não sei nada, apenas tiro ilações do que se vê neste vídeo. 

O que me surpreendeu neste episódio, e às tantas nem sequer devia pois as redes alienam mesmo as pessoas e é mais que vulgar ver-se por ali postagens muito pouco abonatórias,  foi o facto dele ter gravado e PUBLICADO um vídeo onde vemos uma criança a ser "maltratada" verbalmente. Nem mesmo depois de ter sido criticado aceita que não será a melhor forma de repreender a filha bebé: dá o que tem e a mais não se sente obrigado. Está plenamente convencido de ter agido bem e uma porção de "amigos", "fãs", ou o que quer que sejam, até  já lhe deram ânimo, escrevendo que ele "não ofendeu em nada" , que "ele foi mais mãe que muitas progenitoras por aí" e que" notasse a química de amor entre ambos". Ou então: "Qual é o pai que nunca teve um desgaste psicológico? Que nunca sentiu cansaço? Por causa de uma frase querem condenar uma pessoa, vocês seres perfeitos pelos vistos é que precisam de educação". 

A minha cabeça mirra e até dói ao ler estas coisas. Lastimo mesmo que os feeds sejam estes rios onde tudo flutua, acabando os detritos por encalhar à minha frente. A criança ainda não percebe a ofensa o que não quer dizer que, e ainda mais por isso mesmo,  não tenha direito a ser bem tratada. Devemos agora ter compaixão do coitado do João, um caso de esgotamento, um pobre pai que não aguentou o stress de ter de cuidar da Maria Clara, - que ainda só tem 2 anos, prepara-te, homem, vais ter muito que penar! - e que, por isso, não conseguiu conter o palavreado, e, sobretudo, a PARTILHA do vídeo, prova daquele momento de exaustão na rede? E para quê? Só ficou a faltar enviar junto uma corrente de oração para obter força e coragem! Mas que argumento tão patético. Tenho - e não devo ser a única - alguns amigos que são - foram - pais, um deles de gémeas, - e recordo que se queixavam de que criar os filhos pequeninos era muito intenso. Claro que é intenso! Mas duvido que algum deles tenha alguma vez repreendido os filhos assim e eram - e são - pessoas de vida cheia, com responsabilidades de monta, familiares e profissionais, gente que nem sequer tempo tem para andar nas redes sociais a postar fotos. Se o João em vez de estar a gravar um vídeo esticado na chaise longue  estivesse a brincar com a Maria Clara, talvez já não precisasse de a repreender, não é? Essa mania de estar constantemente a publicar vídeos para alimentar a base de fãs, João! Eu, se fosse a Maria Clara, até aprendia a falar mais depressa para lhe retribuir tanto carinho. Imaginem o pai chegar a casa e ela a abrir os bracinhos rechonchudos para ele e a gritar afectuosamente: "Ó meu cabeça de merda, estava cheia de saudades tuas!" E no Dia do Pai, o postalinho: " Para o melhor cabeça de merda do mundo. Amo-te Pai".

Este João é um requinte. Depois de começarem a chover mensagens desagradáveis lá na conta que tem, sai-se assim: "Eeiiiii, agora sou o pior pai do mundo porque chamei cabeça de merda à minha filha. É a minha cabeça de merda, e peço desculpa aos pais moralmente impecáveis." Cada vez mais lindo, João. Mas há mais a justificar o tratamento carinhoso: é uma coisa de família, estão a ver. Diz ele: "Eu chamo cabeça de merda à minha irmã desde que ela é pequenina. Eu não tenho culpa que vocês não tenham ninguém para vos chamar cabeça de merda de uma forma carinhosa. Não tenho culpa que sejam, realmente, uns cabeças de merda". Antes tivesse ficado calado. Que ridículo. Quanto mais fala, mais se enterra. Por acaso eu tenho uma irmã e a ideia de lhe chamar "cabeça de merda" não me soa bem. Mas também tenho um par de amigas que se tratam por "putas" há muitos anos. Só que há aqui uma pequena diferença que o João não está a enxergar. Ele, como pai, tem um dever em relação à pequena Maria Clara que as minhas amigas não se devem mutuamente, sendo adultas, claro. O João sabe perfeitamente que tem direitos mas esquece-se de que tem deveres. Os dois são um pack de inseparáveis. Tem o direito de fotografar a filha mas também tem o dever de a educar, de a de formar. Isso chama-se responsabilidade parental e até é tutelado por lei. 

Os pais influenciam os filhos de toda a maneira e se o João está a educar a Maria Clara sozinho,  ainda mais importante é a sua conduta. Talvez no seu quotidiano o João use linguajar grosseiro e isso seja natural para ele e a sua família. Mas quando é entrevistado na TV sobre as novelas que faz, também o usa? E quando a Maria Clara for para a Pré e começar a chamar "cabeça de merda" aos outros meninos? O João vai igualmente pedir desculpa aos pais moralmente impecáveis que reclamarem como se eles tivessem o dever de aturar as grosserias que ele ensinou à filha? E como é que o João vai proteger a pequena da violência e aconselhá-la a não ser violenta, se já é violento no uso das palavras? Tinha evitado procurar o vídeo, mas entretanto, no Twitter, lá apareceu a pobre Maria Clara que vai ficar famosa porque estava a mexer na TV do pai, ou nas quitangas dele, e este a repreendeu, "carinhosamente", claro. É de partir o coração, a sério. Também porque  a miúda, ainda em clara desvantagem, nem sequer lhe pode esticar o dedo do meio, o que era uma boa resposta.

Dali fui ao Google para saber mais sobre este pai tão querido. Descobri muita confusão na vida dele que não é para aqui agora chamada. O homem parece atrair situações conflituosas, mas depois queixa-se que a imprensa o detesta! Pelo sim, pelo não, se eu soubesse que ele estava na minha vizinhança, manteria pelo menos os 2 metros de distância que fomos aconselhados a manter para nos salvaguardarmos da Covid...Quem tiver curiosidade  pode ver o João Baptista na novela "Amor, Amor", da SIC, creio que está em exibição. Talvez até seja um bom actor. Desconheço qual seja a sua personagem. Talvez um pai babado?

 

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