Sonnets from the Portuguese - O amor de Elizabeth e Robert Browning


A poesia feminina tem sido muitas vezes esquecida: o poeta é um homem. Mas muitas mulheres escreveram poemas ao longo do tempo. Em Portugal, Florbela Espanca, Natália Correia, Sophia de Mello Breyner, Adília Lopes, são os nomes que imeditamente nos ocorrem. Não conheço bem o que aconteceu na Inglaterra mas devem ter existido cantigas de amor medievais da autoria de mulheres.  Não espanta que as mulheres não escrevessem: para isso era preciso ter educação e por séculos as meninas não eram encaminhadas para as letras. Uma mulher que quisesse escrever poemas e competir com os seus pares masculinos,  tinha de possuir bem mais do que a educação básica. Um poeta conhecia os autores do seu tempo e sobretudo os clássicos. Tinha, além da instrução, ócio para poder dedicar-se ao seu affair romantico: a escrita. As mulheres ocupavam-se primordialmente de aprender a serem mães, a tratar da casa, a cuidar da família, a serem reservadas, e a não aspirar a um lugar no mundo. Foi assim por muito tempo. Teriam apoio dos seus e da sociedade para se dedicar a uma tal futilidade? Por regra, não. Em vez disso, as que se atreveram a escrever versos tiveram de se haver com vozes críticas que troçavam das suas aspirações. E afinal com que legitimidade? Pensem no que sucedeu na pintura, área em que as mulheres não podiam pintar a parir de nús, sendo forçadas a fazê-lo às escondidas, ou imaginando, e na forma como isso limitou a sua expressão artística. 

No séc. XVII já se registam algumas vozes poéticas femininas no universos das letras inglesas: Aphra Behn, Anne Bradstreet e Anne Finch. No século XIX muitas mulheres conseguem evidenciar-se na literatura através do romance, e muitas vezes até usavam peseudónimo masculino, em especial no século XIX, mas não para assinarem poemas. Na Inglaterra a poesia feminina da Época Vitoriana foi bem recebida mas como expressão característica da mulher. Daí que os poetas românticos da época fossem apelidados de efeminados: ser romântico, emocional, era coisa da mulher e dos seus versos, e estava bem, mas no homem era defeito. Estava bem mas só até certo ponto pois os poemas sentimentais não eram tão considerados como outros que apresentassem temática menos sentimental, mais objectiva. Foi neste tempo que se destacou Elizabeth Barrett Browning, a autora dos Sonetos, a que me referi no título, e também Christina Rossetti e Emily Dickinson.  

Os Sonetos são alguns dos poemas de amor mais famosos da Era Vitoriana, ou até qualquer outro período. William Thomas Arnold, que escreveu a introdução ao trabalho de Barrett para The English Poets, uma antologia de quatro volumes, escrita poir Thomas Humphry Ward, disse sobre eles: 

Os seus Sonnets estão entre os melhores trabalhos que ela já produziu. Talvez, de facto, seu maior sucesso poético seja encontrado nos Sonetos dos Portugueses, - sonetos, nem é preciso dizer, que não são "dos portugueses" de forma alguma, mas são a apresentação vagamente disfarçada da experiência mais íntima da escritora. No "compartimento estreita do soneto" ela verteu toda a torrente de seu pensamento mais profundo, ainda que a minúcia e requinte do molde, ao mesmo tempo, obrigou a uma poda rigorosa tanto de imagens superabundantes quanto de verbosidade harmoniosa, que teve o mais feliz resultados. Ela é uma das maiores escritoras de sonetos da nossa língua, digna, em todos os eventos, de ser classificada lado a lado com Milton e com Wordsworth.

The sonnets are some of the most famous love poems of the Victorian era or any other period. William Thomas Arnold, who wrote the introduction to Barrett's work for The English Poets, said of them: Her Sonnets are among the very best work she has produced. Perhaps indeed her greatest poetic success is to be found in the Sonnets from the Portuguese,— sonnets, it need hardly be said, which are not "from the Portuguese" at all, but are the faintly disguised presentment of the writer’s most intimate experience. Into the "sonnet’s narrow room" she has poured the full flood of her profoundest thought, and yet the minuteness and exquisiteness of the mould has at the same time compelled a rigorous pruning alike of superabundant imagery and of harmonious verbosity, which has had the happiest results. She is one of the greatest sonnet writers in our language, worthy for this at all events to be ranked side by side with Milton and with Wordsworth.

Sonnets from the Portuguese é uma coleção de sonetos de amor da autoria de Elizabeth Barrett Browning, poetisa inglesa que se inscreve no movimento romântico. Estão entre os sonetos mais famosos da língua inglesa. Conhecida sobretudo por eles, a poetisa também escreveu prosa e traduziu obras clássicas gregas. Browning aprendeu hebreu por si mesma, apreciava as obras clássicas, era católica. De saúde frágil desde a infância, é até conhecida uma carta ao seu primo em que ela descreve o tempo passado fechada num quarto, em quarentena, devido a padecer de tuberculose. Foi forçada a deixar Londres, partindo para a costa, para se recuperar em Torquay, sentindo a falta do conforto familiar e sentindo o peso do isolamento.  

Enquanto os críticos diminuiam os primeiros trabalhos de Robert Browning, também poeta, ela elogiava-o. Acaba por chamar a sua atenção, encontram-se,  trocam 500 cartas em 20 meses. Contra a vontade do pai de Elizabeth, que considerava Browning um caçador de fortunas, o casal foge para casar e ela ainda chega a viver em casa do pai por dias sem que ele desconfie de nada. Depois disso partem para Itália e Elizabeth nunca mais vê o pai. Tiveram um filho e ficaram juntos por 15 anos, até à morte da poetisa.

O livro de sonetos  foi publicado pela primeira vez em 1850. Esses poemas tanto refletem os receios de um amor profundo como a grande afeição dela por seu marido. Os sonetos dão expressão à sua descoberta de uma nova vida. A obra é composta por quarenta e quatro sonetos e o título da colecção serviu para disfarçar a natureza pessoal e romântica da poesia. Robert Browning costumava chamar a sua mulher de “a portuguesa”, sendo essa a inspiração que deu origem ao título.  

Alguns dos seus escritos podem ser entendidos como feministas mas ela também se interessou por temas políticos e sociais, como lutas políticas envolvendo a Itália, as minas e fábricas de trabalho infantil da Inglaterra, e a escravidão, entre outras injustiças sociais, o que nem sempre concorreu para a sua popularidade. 

Sonnets from the Portuguese

No Soneto 30, “Eu vejo a tua imagem através das minhas lágrimas esta noite”, Browning mostra a sua preocupação pela fragilidade do amor e como a entrega total a um sentimento assim pode ser assustadora.

Sonnet 30

I see thine image through my tears tonight,
And yet to-day I saw thee smiling. How
Refer the cause? Beloved, is it thou
Or I, who makes me sad The acolyte
Amid the chanted joy and thankful rite
May so fall flat, with pale insensate brow,
On the altar-stair. I hear thy voice and vow,
Perplexed, uncertain, since thou art out of sight,
As he, in his swooning ears, the choir's amen.
Belovëd, dost thou love? or did I see all
The glory as I dreamed, and fainted when
Too vehement light dilated my ideal,
For my soul's eyes? Will that light come again,
As now these tears come – falling hot and real?

Sonnet 43

Soneto 43, “Como eu te amo? Deixe-me contar as maneiras ”, é um dos sonetos mais famosos da língua inglesa. Todos conhecem How do I love thee? Let me count the ways. Descreve um amor  além da morte, que nunca pode ser medido, demasaido poderoso para ser vencido. Browning interroga-se para compreender os modos em que o amor se manifesta.

How do I love thee? Let me count the ways.
I love thee to the depth and breadth and height
My soul can reach, when feeling out of sight
For the ends of Being and ideal Grace.
I love thee to the level of everyday's
Most quiet need, by sun and candlelight.
I love thee freely, as men strive for Right;
I love thee purely, as they turn from Praise.
I love thee with the passion put to use
In my old griefs, and with my childhood's faith.
I love thee with a love I seemed to lose
With my lost saints, – I love thee with the breath,
Smiles, tears, of all my life! – and, if God choose,
I shall but love thee better after death.


Para ler mais: 
A obra completa, aqui
Manuscrito de How do I love thee, aqui
Biografia da poetisa, aqui.
Sonnets from the Portuguese Full Audiobook by Elizabeth Barrett BROWNING

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