O Verão é a minha praia
Aos primeiros indícios de Verão é tradição as mulheres fazerem fila para a depilação achando-se umas autênticas Chewbaccas à visão terrível da sombra de dois ténues pelos alourados na barriga da perna. Alguns homens também já gritam nas marquesas dos "sofrinetes" de estética: já era tempo de mostrarem alguma solidariedade! Nem as feministas radicais e a sua defesa estoica da penugem como algo natural e revolucionário têm demovido as mulheres que na sua maioria ambiciona uma pele de gata Sphynx. Vale tudo na guerra contra os pelos: alourar, cortar, arrancar, matar os filhos da mãe dos folículos pilosos com luz pulsada. Pelos, só na cabeça, já dizia a Kardashian. Mas a biologia não colabora e ainda não se inventou uma pílula para acelerar a evolução, apenas a definitiva depilação a laser alexandrite que custa coiro e cabelo.
Chegado o solstício há quem não se sinta um peixe na água em sítio algum. É garantido que em algum momento do Verão os utilizadores de transportes públicos odeiem o transporte mais o público que vai nele. O calor torna a mistura de suor e perfume uma experiência intoxicante e o espaço pouco tornar-se-á ainda mais apertado para os corpos dilatados. Enquanto isso, algumas marcas de produtos depuradores intoxicam os ouvidos dos ocupantes de muitos automóveis que se fazem à costa, lembrando-lhes a barriga sentada nos joelhos, desde os primeiros fins-de-semana solarengos do ano. Prometem o degelo de todas as banhas do Inverno e a transformação de autênticas focas em gazelas, sem fome, sem sacrifício, sem ansiedade, enquanto ginásios juram em tom enérgico ter o poder de transmutar qualquer cinquentão grávido num Trazan torneado em tempo record.
As capas das revistas femininas são unânimes em mostrar feericamente os corpos de praia e dar dicas de como conseguir um corpo enxuto em duas semanas. As infografias "como escolher o bikini ideal para cada tipo de corpo - pêra, ampulheta, rectângulo, triângulo invertido, oval" - invadem essas páginas e a internet, a par de sugestões de chapéus e ceiras, óculos de sol, toalhas e saídas de praia, chinelos de dedão e mais. Os homens ainda não têm direito a estas infografias detalhadas sobre como escolher sungas, speedos e tangas. Na sua maioria usam a primeira peça que viram na secção de praia do hipermercado, isto é, calções que descem até abaixo do joelho e que arregaçam perna acima para apanhar sol, e depois do banho espremem cuidadosamente para secar mais depressa, sem despir: é a única altura do ano em que tratam da manutenção da própria roupa com as suas mãos.
O maior medo das mulheres que vão às compras para a praia é não conseguir aproveitar o sol e o mar apenas porque compraram um bikini em triângulo azul às riscas brancas verticais quando o ideal era um cai-cai vermelho. Dúvidas metódicas deste calibre tomam conta das introspecções das banhistas, com excepção daquelas que, despindo-se de preconceitos, optam pelo nudismo, e daquelas outras que andam loucas até à raiz dos pelos porque passaram muita fome, e treinaram duramente ao longo de duas semanas e ainda assim o corpo de praia tarda em surgir no espelho. Algumas delas ponderam antes a compra de um burkini. Sugeria que em vez do burkini da próxima vez comprassem antes uma revista masculina. As revistas masculinas mostram com frequência "copos de praia". Possuem forma arredondada, são invulgarmente louros e coroados de espuma branca, e às vezes são acompanhados por lânguidos caracóis. Percebam a mensagem subliminar: corpos de praia, todos temos; copos de praia, tem quem quer e os homens não vivem sem eles. As mulheres que são por vezes comparadas a "pranchas de surf" pelos/as polícias do corpo vêm a lume dizer-se uma franja esquecida pela indústria bikineira e publicidade. Caríssimas, podia ser pior! A vocês não chamam "porcas de bikini" quando entram em campanhas contra o "body shaming".
Ainda Maio não se apresentava a meio e já nas prateleiras dos supermercados e farmácias se alinhavam embalagens de "linhas solares". Há produtos de todo o tipo, - em líquido, em creme, em óleo, em spray ou em stick, - para aplicar em cada parte do corpo feminino: o cabelo, o rosto, os lábios, o corpo, as unhas, a planta do pé, os artelhos e o hálux. Essa panóplia de produtos avançados e testadíssimos, ostentam nomes de químicos impronunciáveis à mistura com manteiga de cupuaçu, óleo de coco, monoi e açaí, cheirinho de baunilha ou flores perfumadas do Pacífico, que fazem sonhar com os trópicos. São para usar em diversos momentos: antes de ir à praia, quando se vai à praia, e depois da praia ter acabado. Aplicam-se horas antes da exposição ao sol, aplicam-se ao sol, e depois do sol ter ido à sua vida. Não esquecer que existem os específicos a usar no duche subsequente à ida à praia. É no mínimo preciso levar um carrinho de compras para carregar com tudo para a caixa, pagar a crédito e acrescentar uma prateleira lá em casa. E programar as utilizações de tudo isto no telemóvel, com lembretes, também. Displicentemente os homens enfrentam a estação mais quente comprando apenas a maior embalagem de bronzeador ou protector que encontrem à venda no quiosque da marginal da praia, aquele onde vão comprar o tabaco e o isqueiro BIC. Uns espalham o produto à mão cheia no rosto, como quem lava a cara, outros fingem que espalham "aquilo" no corpo. Há sempre uma parte do corpo do homem que escapa à espalhação. Adivinharam: a que fica sob aqueles calções de metro e meio. Por isso, nunca chegam ao fim da embalagem. Lavam-se no mar, aprimoram com uma passagem de água doce no chuveiro da praia, e uma sabonetada em casa. Feito.Chegado o solstício há quem não se sinta um peixe na água em sítio algum. É garantido que em algum momento do Verão os utilizadores de transportes públicos odeiem o transporte mais o público que vai nele. O calor torna a mistura de suor e perfume uma experiência intoxicante e o espaço pouco tornar-se-á ainda mais apertado para os corpos dilatados. Enquanto isso, algumas marcas de produtos depuradores intoxicam os ouvidos dos ocupantes de muitos automóveis que se fazem à costa, lembrando-lhes a barriga sentada nos joelhos, desde os primeiros fins-de-semana solarengos do ano. Prometem o degelo de todas as banhas do Inverno e a transformação de autênticas focas em gazelas, sem fome, sem sacrifício, sem ansiedade, enquanto ginásios juram em tom enérgico ter o poder de transmutar qualquer cinquentão grávido num Trazan torneado em tempo record.
As capas das revistas femininas são unânimes em mostrar feericamente os corpos de praia e dar dicas de como conseguir um corpo enxuto em duas semanas. As infografias "como escolher o bikini ideal para cada tipo de corpo - pêra, ampulheta, rectângulo, triângulo invertido, oval" - invadem essas páginas e a internet, a par de sugestões de chapéus e ceiras, óculos de sol, toalhas e saídas de praia, chinelos de dedão e mais. Os homens ainda não têm direito a estas infografias detalhadas sobre como escolher sungas, speedos e tangas. Na sua maioria usam a primeira peça que viram na secção de praia do hipermercado, isto é, calções que descem até abaixo do joelho e que arregaçam perna acima para apanhar sol, e depois do banho espremem cuidadosamente para secar mais depressa, sem despir: é a única altura do ano em que tratam da manutenção da própria roupa com as suas mãos.
O maior medo das mulheres que vão às compras para a praia é não conseguir aproveitar o sol e o mar apenas porque compraram um bikini em triângulo azul às riscas brancas verticais quando o ideal era um cai-cai vermelho. Dúvidas metódicas deste calibre tomam conta das introspecções das banhistas, com excepção daquelas que, despindo-se de preconceitos, optam pelo nudismo, e daquelas outras que andam loucas até à raiz dos pelos porque passaram muita fome, e treinaram duramente ao longo de duas semanas e ainda assim o corpo de praia tarda em surgir no espelho. Algumas delas ponderam antes a compra de um burkini. Sugeria que em vez do burkini da próxima vez comprassem antes uma revista masculina. As revistas masculinas mostram com frequência "copos de praia". Possuem forma arredondada, são invulgarmente louros e coroados de espuma branca, e às vezes são acompanhados por lânguidos caracóis. Percebam a mensagem subliminar: corpos de praia, todos temos; copos de praia, tem quem quer e os homens não vivem sem eles. As mulheres que são por vezes comparadas a "pranchas de surf" pelos/as polícias do corpo vêm a lume dizer-se uma franja esquecida pela indústria bikineira e publicidade. Caríssimas, podia ser pior! A vocês não chamam "porcas de bikini" quando entram em campanhas contra o "body shaming".
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