Petição Pública: Salvemos as pegadas de dinossauros de Carenque!



Todos conhecem Sir David Attenborough e todos o adoram! Ninguém como ele soube aproximar-nos tanto do mundo natural que nos rodeia através da televisão. O naturalista foi um verdadeiro pioneiro no uso das tecnologias da comunicação ao serviço da divulgação dos tesouros da vida selvagem. É uma inspiração para muitos e um homem com uma carreira excepcional e fascinante, a merecer, quem sabe uma postagem longa e apaixonada numa próxima oportunidade. Hoje apenas o chamei aqui para estabelecer um paralelo com António Marcos Galopim de Carvalho, o português conhecido como o "avô dos dinossáurios", também ele um homem digno de toda a nossa admiração.

Conhecido por ser um grande defensor do património cultural e científico, tendo-se tornado um símbolo da defesa e valorização de Geologia (incluindo a Paleontologia), do património geológico e da profissão de geólogo, lutou pela defesa das grandes jazidas com pegadas de dinossáurios descobertas em Carenque, Sesimbra – Espichel e Serra D’ Aire, tendo salvo as pegadas da destruição. Apaixonou o público português pelos dinossáurios e ficou, desde então, conhecido como o avô dos dinossáurios. A exposição que organizou, a primeira exposição de dinossáurios em Portugal, teve um enorme impacto no público. Aconteceu em 1992/1993 no Museu Nacional de História Natural e da Ciência (MUHNAC) com esqueletos completos e dinossáurios robotizados.

A exposição intitulava-se-se “Dinossáurios Regressam a Lisboa” com uma afluência recorde de 350 mil visitantes em 11 semanas.  Esta exposição aconteceu ao mesmo tempo, creio eu,  que o filme de Steven Spielberg, Jurassic Park, que veio provocar uma autêntica dinomania!

Deparei-me com um apelo do Prof. Galopim de Carvalho no Facebook. Desconhecia que o projecto de conservação e exploração da jazida de Carenque está parado no tempo e à mercê da degradação. Ora, vivendo eu numa cidade onde também, bem próximo, nas falésias do Cabo Mondego, existem valiosas pegadas de dinossáurio - vejam estas fotografias e explicações,  -  fiquei sensibilizada com o apelo e assinei a petição. Mais uma vez, e como em tantos casos,  um património tão único, devidamente avaliado e valorado por peritos, não é considerado como necessitado de intervenção  prioritária, estando exposto à incúria geral e até ao vandalismo, e, inclusivamente, após investimentos vultuosos já feitos para fins da sua preservação.

É, pois, um pedido de ajuda do avô dos dinossáurios que hoje aqui publico para lerem. Caso assim o entendam, assinem a petição e divulguem junto de mais interessados.

Pixabay

APELO : Salvemos as pegadas de dinossauros de Carenque


"33 ANOS A LUTAR DINOSSÁURIOS E A BATALHA DE CARENQUE, é o título de um livro que dei a público na Editorial Notícias, em 1994, hoje esgotado.

Este é um texto longo e todos sabemos que, via de regra, o número de leitores é inversamente proporcional à extensão das prosas. Mas é um grito de alerta e de revolta por algo de muito importante, em vias de se perder para sempre.

MAS NADA SE FAZ SEM ESFORÇO.

GANHÁMOS UMA LUTA MAS FALTA GANHAR A GUERRA.

E a verdade é que precisamos da todos.

Para VERGONHA do “Instituto de Conservação da Natureza”, a jazida com pegadas de dinossáurios de Pego Longo (Carenque) que, há 22 anos, por solicitação minha, em nome do Museu Nacional de História Natural, classificou como MONUMENTO NATURAL (Dec. Nº 19/97, de 5 de Maio), encontra-se no mais confrangedor abandono, convertida, de novo, em vazadouro clandestino e densamente invadido pela vegetação autóctone, mais parecendo uma selva conspurcada por lixo.

Diz o citado diploma legal que cabe a este Instituto (agora também, ilogicamente, dito “das Florestas”), zelar pela proteção e conservação dos Monumentos Naturais que oficialmente classifica.

Uma vergonha!

Esquecida também dos poderes local (a autarquia sintrense) e central, esta importante jazida, em fase acelerada de destruição, está bem viva na mente de todos os que, como eu, sabem do que estão a falar, ou seja, os geólogos, docentes e investigadores nacionais nesta área científica e todos os especialistas internacionais que aqui acorreram, das Américas à China e à Mongólia, sem esquecer, claro, os nossos vizinhos da Europa. Está, ainda, no coração de todos os que respeitam os valores da Natureza.

A luta pela defesa desta jazida paleontológica, que ficou conhecida por “Batalha de Carenque”, remonta a 1986, (há 33 anos, portanto) quando dois finalistas da Licenciatura em Geologia da Faculdade de Ciências de Lisboa, Carlos Coke e Paulo Branquinho, meus ex-alunos, descobriram um vasto conjunto de pegadas de dinossáurios no fundo de uma pedreira abandonada, na altura a ser usada como vazadouro de entulhos e lixeira clandestina, em Pego Longo, concelho de Sintra, na vizinhança imediata de Carenque.

Esta importante jazida paleontológica corresponde a uma superfície rochosa com cerca de duas centenas de pegadas, de onde sobressai, pela sua excepcional importância, um trilho com 132 metros de comprimento, no troço visível, formado por marcas subcirculares, com 50 a 60cm de diâmetro, atribuídas a um dinossáurio bípede.

Além deste, considerado na altura o mais longo trilho contínuo da Europa, identificaram-se, na mesma superfície, pegadas tridáctilas atribuíveis a carnívoros (terópodes), parte delas igualmente organizadas em trilhos.

O chão que suporta estas pegadas corresponde ao topo de uma delgada camada de calcário do Cretácico (com cerca de 92 milhões de anos), com 10 a 15cm de espessura, levemente basculada para Sul. Muito fracturada (à escala centimétrica), esta camada assenta sobre uma outra, bem mais espessa, de natureza argilosa, condições que dão grande fragilidade à dita camada de calcário e, portanto, a esta jazida.

Para além das consequências inevitáveis de degradação decorrentes do uso deste enorme buraco como vazadouro, fui alertado, em Maio de 1992, para o facto de o traçado da então projectada Circular Regional Exterior de Lisboa (CREL) vir a destruir a maior parte do trilho principal, precisamente no seu troço mais interessante. Louvavelmente, a Brisa, empresa interessada neste processo, apercebeu-se do valor patrimonial em causa, mantendo-se em consonância com o Museu Nacional de História Natural na procura de soluções que corrigissem uma tal situação, não desejável.

Após uma longa batalha, de que a comunicação social de então deu ampla divulgação, a abertura dos túneis de Carenque foi, finalmente, a solução aceite pelo governo, representando para as finanças públicas um esforço acrescido, na ordem de um milhão e seiscentos mil contos (8 milhões de euros), merecedor de aplauso. Dois anos e meio depois, a 9 de Setembro de 1995, o então Primeiro-Ministro Cavaco Silva inaugurava a CREL, tendo tido a atenção de me incluir na comitiva que com ele percorreu os túneis de Carenque sob as pegadas de dinossáurios que tanta tinta têm feito correr. Terminava, assim, uma primeira batalha entre os cifrões e a cultura científica, de que esta, em boa hora, saiu vitoriosa.

Mas a guerra não ficou ganha. Há, ainda, como todos sabemos, uma última batalha que é imperioso e urgente ganhar. Ganhá-la passa pela conveniente musealização do sítio, cujo projecto de arquitectura, “Museu e Centro de Interpretação de Pego Longo (Carenque)”, da autoria do Arqº. Mário Moutinho, aprovado pela Câmara de Sintra em 2001 (sob a presidência de Edite Estrela), aguarda há 17 (dezassete) anos o necessário cabimento de verba.

Desde então, com a queda da presidência do PS para o PSD, nada mais foi feito. Simpático, acolhedor e, até amistoso no modo como sempre me recebeu, Fernando Seara nada fez pela salvaguarda deste importante geomonumento. Idêntico tratamento recebi, mais recentemente, de Basílio Horta, mas, infelizmente, tudo continua nos esquecimento. O desinteresse destes senhores pela cultura científica é evidente e lamentável.

A concretização deste projecto não necessita ser encarada em bloco. Pode ser faseada no tempo, começando pelas peças mais urgentes e atractivas. Não é compreensível ter-se dispendido tanto dinheiro na abertura dos túneis, para salvaguarda da jazida, e não viabilizar, agora, o financiamento necessário à conclusão da obra prevista e tirar dela os dividendos culturais e pedagógicos que é lícito esperar como potencial pólo de atracção turística.

Passados 33 anos sobre a sua descoberta, o trânsito automóvel flui normalmente sob um raro e valioso património, lamentavelmente deixado ao abandono. Entretanto, a jazida degrada-se sob a vigência de uma administração cega, surda e muda, indiferente aos milhões já ali investidos, não obstante a obra em falta representar muito pouco face à cifra já gasta com a abertura dos túneis.

E quando, em nome dos euros, se argumenta contra este empreendimento, podemos responder com o enorme potencial turístico desta jazida. A topografia do terreno permite uma boa adaptação do local aos fins em vista, dispondo do lado SW de um pequeno relevo (residual da exploração da pedreira) adaptável, por excelência, a miradouro, de onde se pode observar, de um só golpe de vista e no conjunto, toda a camada – uma imensa laje pejada de pegadas – levemente basculada no sentido do local do observador, numa panorâmica de justificada e invulgar grandiosidade.

Em acréscimo deste significativo potencial está o facto de a jazida se situar na vizinhança de uma grande metrópole e numa região de intensa procura turística (Sintra, Queluz, Belas) e, ainda, o de ser servida por duas importantes rodovias, a via rápida Lisboa-Sintra (IC-19), por Queluz, e a Circular Regional Externa de Lisboa (CREL-A9) que a torna acessível pelo nó de Belas e, no futuro, mais comodamente, pelo nó de Colaride.

O reconhecimento desta jazida como valioso e excepcional relíquia geológica e paleontológica, à escala internacional, é hoje um dado adquirido. Assim e tendo em conta a condição privilegiada da região sintrense e a sua classificação, pela UNESCO, como Património Mundial, justifica-se todo o envolvimento que possa surgir, por parte das administrações local e central, nesta realização, que transcende não só as fronteiras da autarquia, como também as do País.

Todos sabemos que os dinossáurios constituem um tema de enorme atracção entre o público e que qualquer iniciativa neste domínio da paleontologia está votada ao sucesso. Nesta realidade, a Jazida de Pego Longo, convenientemente adaptada a uma oferta de turismo da natureza, de grande qualidade e suficientemente bem equipada e promovida, garante total rentabilidade a todo o investimento que ali se queira fazer.

Pela minha parte, continuo a oferecer, graciosamente (como sempre fiz), o meu trabalho na concretização deste projecto.

Como cidadão profundamente envolvido nesta causa, sinto-me no dever e no direito de nela voltar a insistir.

Esquecidas dos poderes local e central, as pegadas de dinossáurios de Carenque estão bem vivas na mente de todos os que, como eu, sabem do que estão a falar, ou seja, os geólogos, docentes e investigadores nacionais nesta área científica e todos os especialistas internacionais que aqui acorreram, das Américas à China e à Mongólia, sem esquecer, claro, os nossos vizinhos da Europa. Estão, ainda, no coração de todos os que respeitam os valores da Natureza.

Lembrando a sessão de dia 11 de Fevereiro de 1993, no Parlamento, sob a presidência do, para mim, saudoso Prof. Barbosa de Melo, na qual foi votada, por unanimidade (coisa rara), a recomendação ao executivo, no sentido da salvaguarda desta jazida paleontológica, apelo, uma vez mais, ao governo e à autarquia sintrense que reúnam vontades e interesses a fim de que se não perca este valioso património tão antigo quanto cento e doze mil vezes a História de Portugal.

A. M. Galopim de Carvalho"



Galopim de Carvalho, nascido em Évora, em 1931, é licenciado em ciências Geológicas pela Universidade de Lisboa (1959) e doutorado em Geologia pela mesma Universidade (1969). Jubilou-se em 2001 como professor catedrático do Departamento de Geologia da Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa. Em 1992 foi nomeado Director do Museu Nacional de História Natural e esteve à frente do seu destino entre 1993 e 2003. É responsável por inúmeros projectos de investigação. Dirigiu e integrou diversos organismos nacionais e internacionais, nomeadamente a comissão Oceanográfica Intergovernamental da UNESCO. Foi consultor científico na revisão de textos no âmbito das Ciências da Terra e consultor científico da RTP para as séries televisivas de divulgação científica na mesma área. É autor de vasta bibliografia científica e pedagógica na área das Ciências da Terra. Escreveu diversos livros e na área da literatura de ficção obteve assinalável êxito com: “O Cheiro da Madeira” (1994) e “o Preço da Borrega” (1995). Publicou em 1997 “Os Homens não tapam as orelhas” e em 2001,"Com poejos e outras ervas”. 

É, pois, um homem que também todos devíamos admirar, não vos parece?

Antes de fechar a publicação, uma questão.  Porque existem duas palavras - dinossáurio ou dinossauro - para denominar estes animais que povoaram o nosso planeta há 200 milhões de anos?
Encontrei uma opinião bem fundamentada sobre a origem dos dois termos. Afinal ambas as grafias são lícitas, encontrando-se consagradas e consolidadas na literatura científica portuguesa. 
O termo Dinosauria foi cunhado por Sir Richard Owen (n.1804 - f.1892), médico e paleontólogo britânico, quando Owen apresentou na “British Association for the Advancement of Science”, em 1841, uma comunicação sobre répteis fósseis da Grã-Bretanha. O termo é, portanto, um neologismo formalizado por Owen em meados do séc. XIX. Daqui deriva o vocábulo português dinossáurio. 
Mas, quando surge o termo em português? E por que razão existem duas grafias distintas? O termo “dinossauro” chegou ao português do mesmo modo que dinosaur (ou deinosaur) ao inglês e dinosaure ao francês, i.e., como modificação do vocábulo latinizado Dinosaurus (como no nome genérico Tyrannosaurus), ou então como simples importação e adaptação do termo inglês ou do francês. 
Por seu turno o vocábulo “dinossáurio” resulta da modificação de Dinosauria (nome igualmente latinizado de ordem de répteis), tal como no inglês a palavra saurian (adj. e sub.) resulta da modificação de Sauria (outra ordem de répteis).

(Adaptado de: SILVA, C.M. DA (2001) - Dinossáurio ou dinossauro, eis a questão! Al-Madan, Almada, II sér., 10 (Secção - Crónica de Paleontologia): 14-16.)
Sugestão de leitura:

Facebook do Prof. Galopim , de onde extraí o texto supra

Alunos de Sintra formam cordão humano em defesa das pegadas de dinossáurios de Carenque

Entrevista com o prof. Galopim de Carvalho

Monumento Natural de Carenque




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