O livro de São Cipriano ou o tesouro do feiticeiro: quem já leu?


Sempre ouvi falar no Livro de São Cipriano, mas nunca vi nenhum à venda em livrarias, nem em feiras do livro ou alfarrabistas, possivelmente porque nunca me interessou procurar por ele. Sabia que era considerado um livro maldito, e que São Cipriano era "São", logo, santo. Parecia não bater a bota com a perdigota. O Google é nosso amigo. Eram duas da manhã, e eu até já via São Cipriano a dobrar! Mas não era magia branca nem de cor alguma, nem fruto do adiantado da hora: numa primeira leitura, pareciam existir dois santos com o mesmo nome, um, Cipriano de Antióquia; outro, Cipriano de Cartago. Mas Cipriano de Antióquia, que  foi martirizado por volta de 300 d.C. por ser cristão, é que é o Cipriano das feitiçarias e rituais, a quem é atribuído o livro. Já Cipriano de Cartago viveu no século II , também foi martirizado,  mas foi o primeiro bispo africano, tendo desempenhado  um importante papel na disseminação do catolicismo em África, e é um dos doutores da igreja. 

Cipriano de Antióquia, o feiticeiro, nasceu na cidade de Antioquia, hoje, Antáquia, na Turquia, em 250 d.C. , filho de pais ricos e pagãos. A cidade, o principal centro comercial e industrial da província romana da Síria, continha uma população maioritariamente romano-helênica. Antioquia era então a terceira maior cidade do império romano, conhecida por “Rainha do Oriente” em virtude da arte romana e do luxo oriental ali reunidos. Parece que a libertinagem e a lascívia eram o pão nosso de cada dia e de cada noite nos quatro cantos da bela Antioquia. Alguns dos cultos religiosos ali praticados estavam associados à sexualidade e fertilidade, como o da deusa Astarte. Curiosamente, Antioquia foi o local onde os seguidores de Jesus foram chamados pela primeira vez de cristãos.

Cyprianus, em vez de ir jogar às nozes com os amigos, - entre os romanos dizia-se que os meninos estavam a deixar as nozes, "nuces relinquere", tal era o fascínio das crianças e jovens romanos pelos jogos com nozes! -  foi desde miúdo incentivado pelos pais a estudar a ciência dos sacrifícios que se ofereciam aos ídolos, por ele manifestar inato talento para tanto. Li que teve pacto com o diabo e relações íntimas com todos os espíritos infernais, embora não consiga alcançar em que badalhoquices é que ele se terá envolvido. Aos 30 anos, viajou até à Babilónia para aprender com os Caldeus, povos semitas do sul da Mesopotâmia que habitavam na margem oriental do rio Eufrates. Os Caldeus foram pioneiros nos estudos sobre astrologia e astronomia e  avanço dos estudos da matemática. Cipriano, que nascera com vocação para a mística e para a vida impura e escandalosa, escarnecia abertamente da religião cristã e dos conselhos de Eusébio, um colega de estudos. Mas um dia "Deus tomou a decisão de converter este infeliz vaso de contumélias e ignomínia em vaso de eleição e de honra. " O seu destino cruza-se com o da rica e  bela Justina que se tinha convertido ao cristianismo e convertido os pais, vivendo em oração e retiro, como esposa de Cristo. Aglaide encantara-se de amores por Justina e os pais desta logo concordaram com o casamento. Mas Justina não estava pelos ajustes: ela pertencia a Cristo. Aglaide convoca então Cipriano, o feiticeiro, que oferece aos demónios muitos e horrendos sacrifícios. Os demónios em vão tentam fazer Justina cair na tentação carnal, a sua fé era mais forte que qualquer feitiço diabólico. Justina a tudo e todos repelia com o sinal da cruz e o poder da oração. Cipriano, frustrado. interpela o demónio  e este confessa-lhe que o Deus dos cristãos é que era o supremo Senhor dos céus, da terra e do inferno. Cipriano, sentindo mal empregues os seus talentos, não hesita em descartar o demónio: doravante irá então servir a um senhor mais poderoso. Reforçado na sua escolha por Eusébio, amigo antigo, Cipriano conseguiu reagir a todas as tentações diabólicas que o perseguiram. Queimou os livros de magia e distribuiu pelos pobres as suas riquezas. Cipriano, e também Aglaide são baptizados, enquanto Justina corta os cabelos em sinal de sacrifício. 

Cipriano obra milagres, isso e a sua eloquência converteram muitos aos cristianismo. A sua fama alcançou Diocleciano, o imperador. Os cristãos praticavam sua religião no território romano desde o séc. I. Não reconheciam a divindade do imperador e como praticantes de uma religião transgressora, que desconsiderava a moralidade, eram perseguidos. As medidas persecutórias (éditos) de Diocleciano destinavam-se a restaurar a pureza moral do Império Romano, o respeito às leis romanas que promoveriam a indulgência divina e a credibilidade na divindade do Imperador. O Imperador mandou prender Cipriano e a santa Justina. Confessaram a sua fé ao juiz, que os mandou açoitar duramente, com cordas e ferros. De seguida, como se não cedessem, foram atirados para uma caldeira de pez, banha e cera a ferver. Mas pareciam imunes a todo o sofrimento, de tal forma que um sacerdote pagão, tentando capitalizar fama com aquele momento, invocou os demónios, convencido que eram eles que protegiam Cipriano, e lança-se na banha ardente, morrendo imediatamente. O juiz enviou carta a Diocleciano dando conta do sucedido e este mandou então que os dois fossem degolados.Os corpos ficaram expostos por dias, até que um grupo de cristãos os recolheu e levou para Roma. Mais tarde, o imperador cristão Constantino,  ordenou que os restos mortais de Cipriano fossem sepultados na Basílica de São João Latrão, localizada em Roma. Esta é a catedral do bispo de Roma,  o lugar de onde o Papa dá a sua benção a cada Quinta-feira Santa. Eis a lendária vida de São Cipriano: de feiticeiro a mártir e santo. Um relato onde convivem Diabo e Deus, o profano e sagrado, o pecado e pureza, ou seja, a dualidade que alimenta a história da fé desde os primórdios.

A este tipo de livros chama-se grimórios, ou também engrimanços, palavra que desde logo me chamou a atenção no livro de Cipriano, onde aparece escrita com "i". Um pulo ao dicionário revelou-me o significado: maneira ininteligível de falar, discurso obscuro, artimanha, estratagema. Parece muito adequado para designar um manual de artes mágicas. Depois fui pesquisar por "grimório": trata-se de tipo de um livro escrito entre o final da Idade Média e o século XVIII. Contém correspondências astrológicas, listas de anjos e demónios, orientações sobre como efectuar feitiços ou misturar remédios, conjurar entidades sobrenaturais e fazer talismãs. A palavra grimório vem do francês antigo gramaire, da mesma raiz que a palavra gramática. Na metade final da Idade Média, gramáticas de latim (livros sobre dicção e sintaxe de latim) eram guardados em escolas e universidades controladas pela Igreja. Para a maioria iletrada, livros não-eclesiásticos eram suspeitos de conter magia. Mas, por outro lado, uma gramática é também um livro de instruções básicas, que representa a descrição de uma combinação de símbolos, contendo também a descrição de como combiná-los, de modo a criar frases lógicas. Um grimório, por sua vez, seria a descrição de uma combinação de símbolos mágicos e de como combiná-los de forma apropriada.

Entre os mais famosos grimórios existentes estão As Clavículas de Salomão, O Grimório do Papa Honório, O Enchiridion do Papa Leão. É engraçado que os autores da colectânea de tradições orais se refugiassem em nomes de santos e papas para dar credibilidade aqueles escritos. Mas ao contrário da Igreja que apregoava que pela morte se alcançaria a vida eterna e bens que na terra seriam impossíveis, estes compêndios de magia prometiam o acesso aos prazeres impossíveis  no aqui e agora, e ainda hoje atraem a curiosidade de muitos. No Brasil, o Livro de São Cipriano é usado largamente nas religiões afro-brasileiras, está muito enraizado na crendice popular. Há quem considere ser pecado possuí-lo ou simplesmente tocá-lo.

Na internet surgem muitas pessoas questionando onde comprar o livro e outras tantas relatam os mais estranhos e fantásticos acontecimentos depois de terem contactado com o seu conteúdo e aconselham distância. Isto apenas aumenta o mistério e a curiosidade em torno das páginas malditas e alimenta o negócio. Alguns destes livros vendidos online têm preços exorbitantes! Escusado será dizer que com esse valor se podem comprar uns 4 livros de boa ficção de excelente qualidade, livros poderosos, com magia literária de sobra para fazer esquecer os desaires desta vida e os amores não correspondidos aos mais infelizes de nós. Acompanhe-se com uma garrafa de bom vinho, que existem alguns, dizem os entendidos, até são capazes de dar vida aos mortos. Esta é a minha receita.

Para que conste, li o livro, - não na íntegra, como é óbvio, que a minha paciência tem limites e o meu tempo ainda mais - e nada de ruim me aconteceu. Mas se receiam algum mal, sugiro que não continuem a leitura pois irei desvendar parte do seu conteúdo. Respeito quem tenha reservas  em relação a matérias ocultistas, mas reforço que  o mal nunca esteve, nem estará, num livro e antes nas más acções da criatura mais imperfeita que caminha sobre a terra: o Homem. E, a ser assim, este livro pode realmente ser usado para o mal, desde logo, para a morte de tantos animais inocentes, por quem não tenha escrúpulos ou cabeça melhor para pensar.


Esta edição do livro de São Cipriano, à venda online, na Wook, tem 336 páginas, é da Editora Nascente, e parece seguir o exemplar que se encontra na Biblioteca Nacional, a mais antiga versão que se conhece do livro em português - Livro de São Cipriano ou tesouro do feiticeiro - e que data de 1800. Está acessível a consulta online.

O exemplar que se encontra na Biblioteca Nacional é composto por três volumes. A primeira parte aborda a vida do feiticeiro, dá instruções aos religiosos para saberem se as moléstias que vão tratar são obra do diabo, se são naturais ou sobrenaturais, lista exorcismos para expulsar o diabo do corpo, orações para curar moléstias, mesmo naturais, etc. Seguem-se maneiras de desencantar tesouros e os lugares onde estão tinas, saquinhas, moedas de ouro e prata, pérolas e diamantes, ao que percebi em Portugal e na Galiza; depois vem a explicação dos fantasmas - que só aprecem aos fracos de espírito - e sombras, como deitar cartas, considerada a mais recente das "ciência das conjecturas", ou de predizer o futuro pela inspecção de coisas sem importância. Ao longo da história e em diversos lugares dos mundo, muitos objectos servem para o efeito, mas aqui são as cartas os eleitos. A seguir ficamos a saber a nomenclatura dos atormentados pelo demónio: aos obcessos, o diabo atormenta-os por fora; os malfisiados sofrem dores e moléstia, fruto de feitiçaria; os possessos,  têm o diabo no corpo; os reptisios, têm pacto com o diabo e são arrebatados pelo ar; os phitonicos, têm espírito que adivinha; os lunáticos, são atormentados nos crescentes e minguantes da lua, e aos fascinados, o diabo leva-os a obrar e falar sem saber o que dizem. De seguida, muitas páginas para aprender a ler a sina, isto é, a arte de adivinhar pelas linhas da mão a fortuna ou desgraça das pessoas. Também se explica como adivinhar com seis pausinhos de alecrim.


A segunda parte do livro, tem mistérios de feitiçaria que foram extraídos de um livro que se julga do tempo dos mouros. Inclui magia negra e branca, feitiçaria para o bem e para o mal, receitas para apressar casamentos, etc. Começa por ensinar a fazer uma cruz em madeira de cedro: Depois vem a magia das favas: há que matar um gato preto e enterrá-lo no quintal com uma fava em cada olho, outra debaixo da cauda e uma em cada ouvido. O lugar deve ser regado todas as noites até da terra brotar planta que dê favas. Depois é colher as favas e levá-las para casa. Uma de cada vez deve ser colocada na boca. Um delas há-de tornar a pessoa invisível e isso sabe-se porque a pessoa começa a sentir-se assim. Então é só guardar essa poderosa fava e usar quando for preciso.

Seguem-se mais magias com gatos pretos, que nem sempre sobrevivem após processo, como já todos bem entendemos. Os cães pretos também eram usados nos trabalhos. Animais de pelagem negra têm muita força de mágica. Por exemplo, há que cortar as pestanas de um cão preto, um pedaço de pelo do rabo, as unhas, queimar com alecrim do norte, meter em frasco de vidro com cortiça e ao fim de nove dias está o feitiço pronto. E para que serve? Para enamorar alguém. Para o efeito, é só preparar um cigarro, mas tem de ser forte, e juntar uma pitada desta mixórdia. Depois basta deitar uns bafos de fumaça para cima do pretendido amor.

Há uma receita bem curiosa para conseguir o amor do homem: a mulher deve obter do homem um objecto de prata que deverá manter consigo por dois dias. Depois, segurando esse objecto, uma moeda, numa mão, dá a beber ao homem  um cálice de vinho onde se misturou láudano, uma cabeça de enguia e sementes de cânhamo. Se o "medicamento" não surtir efeito, assim que a mulher consiga ter o homem a sós deve dar-lhe a beber uma chávena de chocolate onde juntou noz moscada, canela, baunilha e dentes de cravo, sem esquecer que estes devem ser retirados antes de servir. Acrescentem-se gotas de cantárida, por vezes referido como Spanish fly ou mosca-espanhola. (Fiquem a saber que é um preparado conseguido a partir de insectos, como besouros, joaninhas, gorgulhos.)Se o indivíduo desejar comer alguma coisa, o livro indica que deve ser pão-de -ló. Se  não houver vinho nem chocolate, pode usar-se café. Neste caso usa-se antes erva doce e umas gotas de tintura de cantárida. O livro avisa que o homem logo desconfiará que a mulher o quer enfeitiçar mas não dá pistas de como é que ela irá desfazer essa bota.  Também informa que a prescrição é para repetir a cada 15 dias. Algures neste intervalo, a  mulher deverá convidar o homem para almoçar e servir-lhe uma fritada ou omoleta. Não sei como é que ele irá aceitar tendo provado aquelas mistelas, mas é este o caminho. A omoleta tem um segredo: os ovos depois de bem batidos devem ser lançados no alto da espinha da mulher, escorregando pelas costas dela abaixo, indo ser aparados onde acaba a espinha. É omoleta acrobática. Muita faxina deve ter sido feita em virtude de tão arriscado malabarismo. O melhor era recorrer ao auxílio de uma cúmplice. O livro não refere nada sobre a possibilidade de uma mãozinha auxiliar deitar por terra o sucesso da receita. Ao jantar, uma nova iguaria devia ser servida: uma almôndega proteica. Mas, claro, com segredo, desta feita menos acrobático e mais perfumado. Antes de levar ao forno a mulher deve passar as almôndegas pelo corpo suado, peito, costas e barriga, fazendo-os demorar um pequeno tempo debaixo dos sovacos. O café, ao almoço e ao jantar, deve ser coado pela fralda da camisa da mulher, com que ela tenha dormido pelo menos duas noites. Afiança o editor que esta receita tem concorrido para a felicidade de muitas mulheres. Aqui fica. Mas, por favor, não tentem fazer isto em casa, não? 

Há receitas para as mais variadas ânsias, por exemplo, para expulsar o demónio do corpo, outras para proteger dos raios. Há feitiçarias com sapos. Diz o livro que a sua força advém do facto de sapos serem a comida que o diabo dá às almas no inferno. Os pobres animais tinham os olhos cosidos com agulha e um fio de retroz (seda) verde porque alguém acreditava que ia obter algo. Também lhes cosiam a boca com linha preta. A maioria dos sapos acabavam, depois deste transe, dentro de uma panela de barro. Nem sempre morrem mas no final da tortura deviam estar mais mortos do que vivos. Os morcegos também não escapam às agulhas e aos cosimentos criativos. Há receitas para ganhar ao jogo, e uma mágica que implica passar a agulha e linha três vezes pela pele de um defunto. O livro não explica onde iam os praticantes encontrar um morto à mão: se tinham de matar alguém ou se profanavam cemitérios.

O livro também tem diversas histórias, mais ou menos longas, como a História de Cipriano e Elvira. Apenas passei os olhos pelo seu conteúdo mas uma das mais curiosas é a do pastor que matava besouros e os ressuscitava com uma erva que só as andorinhas, as lavandiscas, e os besouros conhecem. Cipriano encontrou um pastor na montanha, Barnabé, de seu nome, que se entretinha a matar, esmigalhando com o pé, e a ressuscitar depois, uma vaca-louca(besouro). O pastor foi por Cipriano equivocado e levado e crer que era antes Cipriano, bispo de Cartago, e até lhe confessou os pecados. Cipriano, ganha a confiança, inquiriu sobre aquele incrível  poder de dar vida. O pastor explicou que se tratava de uma erva mágica, que se cria no monte, mas que só certos animais conheciam. Um dia ele matara um besouro. Daí a minutos, vira chegar um outro, com erva nos cornos. O besouro depositou a erva sobre o pobre bicho desfeito que de novo ganhou vida. Então o pastor tirou-lhe a erva e sempre que matava um bicho de seguida ressuscitava-o! Cipriano logo cobiçou a erva e o pastor ofereceu-se para ir arranjar mais. Foi à procura de um ninho de andorinha com os ovos chocos, retirou-os e cozeu-os em água a ferver, voltando depois a colocá-los no ninho. Quando as andorinhas voltaram logo perceberam que os ovos estavam sem vida e rumaram ao monte colher a erva mágica para colocar sobre os ovos e fazer nascer a criação. O hábil pastor apropriou-se então da erva e entregou-a a Cipriano que assim se tornou ainda mais poderoso.

Umas páginas à frente, leio a magia da pomba preta encantada, em que a pomba, criada com semente de boiamento e água benta, leva uma carta no bico à morada certa e retorna só com a força do pensamento. O que for pedido na carta será feito pelo destinatário. Há também uma receita infalível para casar. Outra temática, é a arte da adivinhação das paixões e tendências das pessoas pelo tamanho do crânio e da fisionomia. Lá se diz que as senhoras, pela forma como arranjam os cabelos, se têm furtado à hipótese de serem adivinhadas assim! Segue-se um tratado de páginas e páginas com características físicas e seu significado, que termina aconselhando homens e mulheres de como escolher a companhia ideal de acordo com elas. Por exemplo: "Não será feliz um homem que se apaixonar por uma mulher cujos dentes sejam curtos e ponte-agudos; não há dinheiro que satisfaça as exigências e os caprichos das mulheres que possuam tal espécie de dentes." Mais adiante um guia de interpretação dos sonhos e aparições nocturnas: fiquei a saber que sonhar com um cadáver é sinal de alegria, boa saúde, amizade.

Da terceira parte do Livro de São Cipriano, constam os "inguerimanços" de São Cipriano ou prodígios do diabo acontecidos na Galiza, o mapa dos tesouros da Galiza com base em pergaminho do séc. XII, considerações sobre espíritos que infestam as casas com estrondos e outras importunidades: fica-se a saber que nem injúrias nem armas nem fogo resolvem o assunto. Para enfrentar esses espíritos o melhor são os sinais da igreja, os exorcismos, orações, jejuns, esconjuros, relíquias dos santos, benzeduras das casas, aspersões de água benta, etc. Uma boa prevenção é ir à missa ao domingo e benzer-se com água benta. A seguir, tudo sobre a buena dicha (arte de ler na mão), os poderes ocultos do ódio e do amor: desta feita são os mochos que são usados para as mulheres prenderem o amor dos homens, ou os ouriços cacheiros para fazer com que a mulher retorne às boas com o seu homem, ou as corujas para manter o homem fiel. Alguma páginas dão nota de magias que se praticam no Brasil ou na China, numa outra refere-se que lagartos são torrados vivos no forno dentro de uma panela. 

E para terminar esta minha incursão pelo livro de São Cipriano,  uma última receita para as mulheres se livrarem dos homens quando estiverem aborrecidas de os aturar, mas sem escândalo: há que ser desmazelada, não se penteando nem se lavando, nem tomando o mínimo interesse carnal quando o homem a desafiar para actos vulgares. Há ainda que meter ao lume numa panela o seguinte: 12 ovos de formigas e duas malaguetas dentro de uma cebola alvarrã (silvestre?) furada. Quando o homem estiver a dormir, destape-se a panela e depois vá passar-se o braço direito por cima do seu peito, enquanto se recita um certo esconjuro mentalmente.

Esta última secção do livro ainda inclui receitas para não ter filhos e para desmanchos, a história da feiticeira Évora, considerações sobre alchimia ou arte de fazer ouro, etc.

N.B. Por favor, não tentem fazer nada disto em casa. Nem no escritório. Nem em parte alguma. Vão por mim. Melhor que qualquer receita de Cipriano, é a minha receita: boa literatura e um copo de vinho.

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"Não faças o mal, e o mal não existirá." — Liev Tolstói

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