Verão é tempo de férias da tecnologia!


De alguns anos a esta parte já me habituei a retirar uma ou duas semanas, sempre no Verão, para me desligar do contacto com o máximo de aparelhos electrónicos que me for possível. São as férias da tecnologia, um par de semanas em que procuro a sua substituição integral por outras formas de ocupar o tempo. Não é que seja uma nomofóbica, - quem diria, mas é verdade, que já foi identificado um medo irracional de estar sem telemóvel ou aparelhos eletrónicos, em especial relacionado com indivíduos altamente dependentes de computadores e jogos de vídeo, - mas também gosto de fazer este teste anualmente e de sentir que continuo no comando: que a tecnologia não manda em mim. O uso destes aparelhos e da internet parece estar a ser diabolizado constantemente mas há bom motivo para ficar alerta.


Tal como no uso excessivo do álcool é complicado perceber quando se ultrapassa o limite aceitável e se cai na dependência da internet e do mundo digital. Mas a dependência tecnológica existe, em especial, a digital, existe. E o medo existe. Este medo é o responsável por ansiedade no momento da separação do usuário com o aparelho, razão pela qual quando um professor priva um aluno de aceder ao telemóvel pode constatar inquietude, por não poder consultar as mensagens, e ansiedade, o que vai dificultar a concentração do aluno na sala de aula. Também se pode desenvolver um apego tão pronunciado ao uso do telemóvel que impeça o rendimento do estudante, em casa, enquanto estuda, incapaz de desligar o seu pensamento da trama online e focar a sua atenção pelo tempo necessário ao processo. A perda da noção do tempo de uso é um dado comum aos usuários, mesmo os não completamente dependentes, e também o desleixo na execução de outras tarefas - ou na sua execução apressada - que se intrometam naquela fruição, ou o alheamento a tudo o que os rodeia, como se vivessem noutra dimensão.

Muitas vezes os jovens, em virtude da sua preenchida vida digital, têm reduzidas interações presenciais, em especial com os adultos, seus familiares, e isso acaba por minar a comunicação entre os dois. Ora, uma boa comunicação é a chave de um crescimento são, emocional, afectivo e pessoal, que assim fica prejudicado. Surgem conflitos e frustrações de parte a parte quando, em desespero de causa, e num momento em que qualquer esforço de conversação já se afigura como inútil, os adultos banem o uso dos aparelhos por parte dos mais novos.

Importa ainda referir que o exagero na utilização desta tecnologia pode ter como resultado a diluição dos laços pessoais e afectivos reais. Será que não nos estamos a tornar mais individualistas, menos gregários e solidários graças à vida digital? Nós, adultos, que já contamos com mais de uma dezena de anos de vida digital em cima, já temos algum conhecimento sobre tudo isto. Parece um contrassenso que  no tempo da "aldeia digital" as pessoas se sintam permanentemente acompanhadas mas mais sozinhas do que quando viviam numa aldeia. Assim é. Algo que aprendi ao longo do tempo foi que, se estiver com problemas, se a minha auto-estima tiver sofrido um abalo ou me sentir de alguma forma vulnerável, não é na internet nem nas teias virtuais que vou encontrar o suporte que preciso. Essa é a pior altura para ir para as redes sociais. Pode sobrevir uma satisfação passageira, uma falsa sensação de apoio, mas nada mais do que isso.

Quem sinta que não tem laços efectivos e reais com alguém, quem se sinta só - e o mais certo é estar algo enganado - também pode entrar nas redes à procura de um substituto afectivo e chegar a pensar que alcançou algo. Mas, o cara-a-cara, é insubstituível. Se alguém não está ao alcance do seu abraço, não serve; não serve, pelo menos, para aquilo que precisa. Se não consegue estabelecer uma ligação com alguém, procure identificar e resolver qual o problema real que está a criar esse bloqueio, procure ajuda próxima para isso, mas não corra para a rede social do momento: acabará com mais um problema, não com a solução para o seu vazio. Se já estiver acabrunhado e triste, sentir-se-á mais triste. Se estiver revoltado, mais revoltado. Se estiver deprimido, cuidado, esse transtorno irá agravar-se. Além disso, o sentimento de inutilidade, de perda de tempo pelas horas ali despendidas, acabará por surgir. Por muito que se escrevam maravilhas sobre as amizades virtuais, nada substitui o amparo providenciado pelo "ombro amigo", o verdadeiro, de carne e osso. O uso excessivo desta tecnologia que tudo promete tem, pois, variados impactos sobre a nossa saúde emocional ou mesmo mental. Não faltam análises da ligação entre consumo digital e diminuição do nosso bem-estar mental.

Além disso, muita da percepção que se retira da vivência digital é do tipo "a galinha da vizinha é melhor do que a minha". Toda a gente parece viver melhor que nós, mostrar melhores experiências: até parece que os outros nunca têm problemas, que é tudo gente feliz sem lágrimas. É de tal forma que quando alguém, em confidência, nos relata a sua vida real sofrida através da caixinha de mensagens damos por nós descrentes: até parece que nos sentimos enganados! É vulgar que os usuários, por comparação, sintam inveja do que veem, outros frustração. A maioria não consegue sentir-se  verdadeiramente feliz perante a felicidade alheia. A regra, afinal, é ficar alegre pelos amigos e os "amigos virtuais", em rigor, são apenas conhecidos, pouco mais que estranhos. Não há realmente garantias de que estarão lá para nós no dia seguinte, pois não?

A tecnologia digital interferiu com a rotina e o nosso descanso e nisto reside um dos seus impactos negativos: os dias confundiram-se com as noites, as semanas com os fins-de-semana. É imprescindível planear a nossa vida de forma a equilibrar descanso, labor e lazer e garantir que a tecnologia não se intromete no nosso horário de sono, que deve ser preservado a todo o custo: é um enorme garante do nosso bem-estar. Há quem até descure a alimentação, substituindo comida saudável por comida rápida para poder passar mais tempo online. Isto acontece quando se sente que o tempo gasto na internet nunca é suficiente e é um sinal alarmante de que já se está viciado.

Por outro lado, são horas e horas que se passam em cadeiras, sofás e camas em posições nem sempre correctas. É de esperar que, mais tarde ou mais cedo, surjam dores musculares na coluna lombar e no pescoço: sou muitas vezes vítima delas. Tanto uso o computador para recreação como para trabalho, e se não for isso a mesa lá está, a omnipresente cadeira e secretária. Há quem se queixe de dores nas mãos e nos polegares: isso nunca tive e também tenho escapado ao síndrome do túnel cárpico - que acontece me virtude da posição do punho em extensão ou em flexão excessiva - ou da tenossinovite de De Quervain, mais própria de quem dactilografa. Além dos impactos músculo-esqueléticos negativos, o estilo de vida sedentário que acaba por ser desenvolvido pela maioria das pessoas que se vicia na tecnologia pode igualmente ser prejudicial à saúde.

Fazer férias da tecnologia é, apenas em parte, uma boa ideia. Estabelecendo o paralelo com o consumo do açucar, uma substância igualmente viciante, de pouco adianta privarmo-nos de açucar durante uma ou duas semanas se levarmos o ano a alambazarmo-nos em doçaria.  O que deve ser o nosso objectivo  é praticar uma vida saudável em todos os aspectos, - sendo moderação a palavra chave - sendo o aspecto digital apenas mais um a merecer a nossa atenção.


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Até breve!

Comentários

Bom tema de escrita. Alguém dizia que algo só acontece se postarmos no Instagram. Geralmente tb cedo à tentação de me conectar mais ao telemovel nas férias ou de ligar makis o computador porque gosto de acompanhar as movimentações no futebol :)
Alex disse…
Consegui estar muito mais desligada estas férias.
Apesar de não conseguir ficar completamente off, acho que este detox das novas tecnologias é bem importante!

Bjxxx
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