How to be a real fashionable girl, vídeo de Kristen Leo



Vi este vídeo - How to be a real fashionable girl - no blogue da Beatriz, Suspiros da Bea, que tem 20 anos e estuda Línguas aplicadas na Universidade do Porto. Kristen, a protagonista  do vídeo passeia em patins meio tropegamente de um lado para o  outro, e enquanto narradora diz que as fashion girls vão com a corrente, que são demasiado cool para se preocuparem com política ou controvérsias.  Di-lo com sotaque francês, que outra Kristen interrompe "para tomar conta da narração", desde logo porque o sotaque da patinadora é falso. Ora, fiquei logo agarrada ao fashion film  pela abordagem criativa de Kristen Leo, que consegue levar até final este diálogo a duas vozes, sobre a fast fashion, as trends, a responsabilidade versus destruição. A filmagem e edição são excelentes, assim como o texto. Fiquei curiosa e fui ver mais vídeos dela.


O seguinte que escolhi ver é aquilo que ela chama um anúncio honesto da H e M.  Eu ligo a estas coisas da moda só o suficiente para andar vestida e calçada. Mais uns anos e ainda acabo como o Steve Jobs que só usava a camisola preta de gola alta e calças de ganga. Só que a dita camisola é do Issey MiYake, o designer japonês, e deve custar uns 200 euros/unidade. Pois é, não ligo muito à moda mas não perco estes detalhes minimalistas. 

Bem, desconhecendo a existência da tal colecção Fruit que a Kristen refere, fui ao site da marca para me inteirar. Lá encontrei uma explicação sobre o que são os "conscious products", presentes nos diversos departamentos, e depois um extenso texto no Papermag, onde se lê, entre outras preocupações ambientais da empresa, que desde 2012, a Colecção Exclusiva Consciente da H e M é uma grande plataforma experimental para um programa (de sustentabilidade). Na sua nona edição deste ano, a variedade de roupas casuais inspiradas na natureza - completada com brocados botânicos, estampas de plumas e microorganismos ampliados e uma paleta de cores informada por gemas - chegou às lojas em 11 de Abril e apresenta um trio de tecidos inovadores. Unindo poliéster reciclado e algodão orgânico na coleção estilo 35, estão peças feitas com Piñatex, um material derivado de folhas de abacaxi que imita o couro, um têxtil parecido com seda feito de cascas de cítricos chamadas Fibra Laranja e uma espuma à base de algas usada fazer solas para calçado. 

É muita fruta, foi o que eu achei depois de ler até final. A Kristen também não foi na cantiga e questiona se a produção da Fruit Collection foi sustentável ou se as pessoas que trabalharam  ganharam um salário condigno. E refere que "a fruta" é produzida à tonelada e enche caixas e caixas, que depois são colocadas à venda em vastas superfícies, mas que não vale nada:  não durará mais do que uma estação. Kristen: é o progresso! É como os pêssegos carecas que são arrancados da árvore ainda verdes, e transportados longas distâncias em frigorífico até ao super, e que já só amadurecem se lhe dermos com o secador de cabelo e os irradiarmos no solário, Kristen. Bem, a Kristen massacra a H e M até final do vídeo apontado cada fruta podre que conseguiu identificar nos processos de produção, venda e cativação de clientes; e depois de mostrar o seu gatinho preto Gigi afirma que há mais um vídeo onde aborda tudo em profundidade e com as respectivas  fontes de informação, como se a gente por algum minuto, depois de a ver e ouvir, fosse duvidar do que diz. Que miúda, pá. Cheia de pelo na venta, diria a minha avó, que sempre questionava porque é que eu tinha tantos sapatos se apenas tinha dois pés.


E não há dois sem três. No terceiro vídeo que escolhi ver, Fashion Brands That Use Sweatshops To Make Your Clothes, Kristen continua a desancar na H e M, - não uso o  eitza ou sinal tironiano porque fica sempre com erro pós-publicação, não sei porquê, e apenas explico para não pensarem que sou tão totó nisto das modas que nem sei escrever bem o nome da marca! - e também outras marcas, ligando e deixando mensagem a alguém que lhe ofereceu muitos presentes envenenados, isto é, roupa feita em "sweatshops", isto é, locais de trabalho sem condições onde pessoas são exploradas até ao tutano. Imaginem o pobre Bangladesh onde 80% das receitas do país são geradas através das exportações de vestuário ali produzido. As mulheres são 85% do número total de trabalhadores da indústria e ganham 25 euros quando o salário mínimo são 50 euros. Trabalham 14 -16 horas por dias, sete dias por semana, para depois nós, aqui na bela Europa, ou os camones nos EUA, podermos comprar camisolas de fraca qualidade que se estragam em três lavagens. Ninguém beneficia dos lucros: os pobres nasceram pobres, vão ter filhos pobres que vão morrer tão pobres como os pais. O ciclo não se quebra. Ah, mas, pelo menos tiveram trabalho ao longo da vida, dirão alguns de vocês. Há sempre alguém que se não o diz, pensa. Pimenta no rabiote dos outros é sempre refrescante. A informação que citei é da War on want. 

A Kristen Leo, que para muitos poderá ser uma espécie de "crazy thrift store lady", é uma Youtuber  - epíteto que também nem sempre é bem recebido em certos círculos, havendo quem  muito desconsidere os "Tubérculos"  - demonstra neste vídeo, num trabalho de edição e montagem muito bem conseguidos, a sua militância e inconformação perante estes dados. 

Desde o meu regresso à blogosfera pude constatar a existência de uma enorme quantidade de blogues de meninas - e alguns de meninos - que não fazem outra coisa senão fotografar-se nos seus novos outfits e falar das trends e das suas wishlists. Estes blogues são numerosos e dos mais activos: a moda e o estilo são um dos assuntos que mais faz teclar as jovens na blogosfera. Desses blogues, muito poucos se dedicam a promover a moda consciente e sustentável. Não sei se um dia não vamos começar a ler no final de cada postagem das fashionable girls uma inscrição do género " Comprar fast-fashion prejudica gravemente a saúde dos outros.", à semelhança de maços de tabaco! Na realidade não precisamos de comprar roupa como se fosse fruta, mas por vontade das marcas isso seria o ideal, e tentam,  com o lançamento de incessantes colecções e assédio publicitário na nossa caixa de email. 

Por incrível que possa parecer eu ainda visto peças que têm mais de 20 anos. Por exemplo, um par de camisolas de malha canelada texturada, uma branca e outra preta, que foram compradas numa pequena loja que já não existe: o Tó Valadas, na Figueira da Foz. Se não me engano o proprietário faleceu e a loja desapareceu poucos anos depois. Como é isto possível? Boa qualidade, boa manutenção e a sorte de o meu corpo não ter mudado assim tanto. Gosto tanto delas hoje como quando as comprei. São intemporais. Simplifiquei muitos aspectos da minha vida e no domínio  da moda reduzi as minhas compras ao mínimo e a um princípio de topo: a independência das tendências. Compro o que gosto e o que me beneficia.  Procuro boa qualidade em vez de quantidade. Sempre agi  assim? Não.

Vi ainda um vídeo onde a Kristen, além de aconselhar o motor de busca Ecosia, um browser alemão que doa pelo menos 80% de sua receita excedente a organizações sem fins lucrativos que se concentram em reflorestamento e conservacionismo - analisou as tendências de 2018 e elegeu aquelas que lhe pareciam ser fugazes e as que se manteriam, aconselhando a que descartassem as primeiras. 

A Kristen é gira, tem ideias em que acredita com firmeza e é criativa na forma como as transmite. Considera-se uma activista que escolheu a internet para a "sua luta": promove os direitos humanos e dos animais, o veganismo, a moda com ética e o bem estar no planeta. Diz que é a "cena dela"  e imagino que com a "sua cena" irrite muito boa gente.  Infelizmente, ela nunca seguiria este blogue: sendo fiel aos seus princípios, bastava ver a fotografia das sardinhas que deitei a estornicar na grelha, anteontem, noite de S. João, para esta escriba ser para sempre considerada personna non grata no seu círculo de amigos. Acredito que a moça não abra excepções: não seria uma tradição semi- pagã que justificaria a morte inglória de seres vivos: os peixes são nossos amigos. Compreendo-a mas, apesar de ter simpatia pelo veganismo, sei que vou morrer a comer peixe e frutos do mar,  e alguma carne, ainda que pouca. Mas, quanto ao que Kristen defende acerca da fast fashion estamos em perfeita sintonia:  #JesuisKristen

Sugestão de leitura

Hoje a minha sugestão é uma postagem minha de 22 de Fevereiro de 2016, justamente sobre moda sustentável: Cinema: True Cost e o movimento da Slow Fashion. Um excerto:

"A minha avó já era adepta do Slow Fashion. Mas na minha juventude a produção têxtil era mais civilizada do que agora. Hoje o avesso da moda é uma realidade suja. Nunca se produziu tanta roupa em tão curto espaço de tempo. Não se trata apenas de pagar salários dignos aos trabalhadores do têxtil  e garantir que os seus postos de trabalho sejam seguros. Trata-se também de usar os recursos naturais de forma sustentável. Trata-se de equacionar se não estamos a esgotar combustíveis fósseis, reservas de água, a transformar terra fértil em terreiros de pó, se não estamos a contaminar o ambiente com a nossa pressa de obter mais colheitas de algodão, carregando nos pesticidas, ou, se depois, usamos pigmentos venosos no tingimento e vazamos para o grande, sem qualquer tratamento, se não estamos a despejar dióxido de carbono para a atmosfera só para fazer voar roupa - da China, India e Bangladesh - à tonelada até ao Ocidente."



Comentários

Beatriz Sousa disse…
Obrigada!
De facto a Kristen pode parecer uma doida para muita gente, mas chama a atenção com os seus vídeos e explica como a moda é insustentável. Algo que muita gente não se apercebe. Aqui na blogosfera, penso que existem demasiados blogs sobre moda e aquela moda de coisas compradas em lojas chinesas de produção em massa que são terríveis!!! Ainda terça-feira estive a falar com as minhas amigas em plena H&M sobre como aquela marca era um porcaria e a contar o que tinha aprendido com a Kristen e elas boquiabertas a concordarem e algumas pessoas também a ouvirem. Acho que o problema nisto tudo é que muita gente não questiona o que acontece à roupa, para onde ela vai e como é que devemos fazer escolhas conscientes.
Nunca me preocupei muito com a moda, aliás é super raro ir ao shopping e tenho roupa de quando tinha 14 anos que ainda uso...
Não digo para irmos todos gastar 200 euros num par de sapatos feito de plástico do mar, mas porque não ir comprando menos e cada vez melhor? Algodão real, marcas mais pequenas que pagam aos funcionários. Se todos diminuirmos o consumo, as marcas percebem que DEVEM mudar.
Okay excedi-me xD vou deixar só por aqui.
Beijocas!!!
Beatriz Sousa disse…
Antes que me esqueça vou partilhar este link no meu post, porque acho que escreveste mesmo muito bem!!