Cognac e filoxera



Que tal foi o vosso almoço domingueiro? O meu começou bem e terminou melhor, com café amargo, um conhaque e uma fatia anafada deste bolo com cobertura de pera, açucar mascavado e canela. E esta história. Por volta de 1870 a filoxera causou forte dano à produção na região de Cognac destruindo os vinhedos. Provavelmente, um navio que partiu da América para Inglaterra transportava no seu bojo uma praga inclemente: a filoxera. Era costume os viticultores europeus importarem videiras oriundas da América. Sem pagar bilhete e sem mostrar passaporte, os piolhos amarelos viajavam clandestinos nas raízes das videiras americanas nativas, que tinham aprendido sabiamente como resistir-lhe. Já as europeias não eram imunes ao seu ataque. Dali para França e depois para Portugal, as videiras europeias encheram-se de folhas amarelas que murchavam. O piolho picava a raiz da videira e sugava a seiva. O maldito empanturrava-se de vida enquanto matava as videiras à fome pois as suas raízes definhavam de tal forma que não conseguiam extrair nutrientes do solo. Por cá sofreu a produção de vinho do Porto, enquanto que na região de Cognac, na França, foi a de conhaque. Lutar contra a filoxera não foi pera doce. Nem pesticidas nem químicos nem sapos presos às vinhas eliminavam o piolho. Restava arrancar as vinhas mortas. Só o enxerto da vinha europeia com a congénere americana resolveria a questão. Mas este casamento de conveniência não era visto como pacífico pelos vitivinicultores que se dividiram entre os defensores da busca por uma solução química e os do enxerto. O governo francês criou até um prémio para quem encontrasse a cura. Mas nem então, nem hoje, se sabe como como lidar com a infestação a não ser por via do enxerto. Em Portugal, as castas Malvasia e Ramisco, na região de Colares, de onde são oriundos alguns dos mais singulares vinhos nacionais, cultivados no solo arenoso, e resguardados do ar marítimo com desmesurado esforço, são imunes à praga.

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