Polémicas de pandemia: as comemorações do 25 de Abril na AR





Assisto à grande inflamação popular, ou apenas de redes sociais, não sei bem, discute-se se devemos ou não assinalar, na AR, em versão minimalista, o Dia da Liberdade. As massas dividem-se, cada uma em busca do triunfo da sua razão, umasde coração na boca, outras com o cérebro atravessado no estômago, ajuntando toda a espécie de argumentos, uns de natureza higiénica, outros patrióticos. Mas uma parte da gente, uma que talvez fosse passar o feriado à praia, e que está agora mais frustrada que um rato de laboratório porque este ano não há solário para ninguém, mesmo que o astro rei compareça, sempre foi indiferente a cerimónias na casa da Democracia, nunca deu ouvidos àquela maçada, um não aquece nem arrefece, apenas pão que vai ao forno mas que não cresce e não doura. Para estes, o 25 ideal era para estar na rua, como a poesia, e não podendo ser assim, ao ar livre, com raios ultravioleta, avermelhando faces em cravo, pulmões inflados e garganta rouca de cantar, em convívio, então mais vale esquecer. A outra parte, a de sofá, insiste na discurseta tradicional no Parlamento, mas não porque vá assistir a algo de que já se cansou. Nas redes, até parece que Portugal anda todo o ano à espera de discursos monocórdicos, e de contar os cravos tristonhos nas lapelas ou nas bancadas, como se esse magro alimento fosse matar a fome de justiça que o 25 anunciou e ainda não cumpriu.  Para outra porção da gente nada disto é pão que se cheire, há anos esperançosa numa revolução serena, um desejo acalentado de que alguém metesse as mãos na massa e reinventasse a celebração da conquista de tantos direitos, a aproximasse dos novos, a tornasse uma festa. Em plena pandemia, eis o pretexto, eis, talvez, a janela que se abre.  Porque o 25 é ainda uma emergência de todos os dias, porque é preciso alimentar o ideal de liberdade, já tão difusa a amargura que foi viver o tempo do fascismo. Mas não. Discursos sem flama, 130 pessoas. Cravos murchos. Formatos pouco elásticos. Massa que não leveda. 25 de Abril sempre.

Comentários

Konigvs disse…
Para que neste momento a maior discussão seja essa é porque a pandemia por cá só possa estar a correr muito bem!
Nada disse…
As pessoas estão de momento com demasiado tempos nas mãos e dá origem a discussões que nem deviam ter chegado a tal. Vamos ser honestos...o 25 de Abril devia ter poder pelo que significa e a sua celebração devia ser não deixarmos tal coisa repetir e ponto. Celebrem em casa e cantem Zeca Fonso...enfimmm...resmunguisses =P
Um beijinho!