Em memória das vítimas de Tiananmen
Foto Tank Man tirada por Jeff Widener - fonte
Passaram 30 anos sobre aquela Primavera. Uma centena de jovens entraram em greve de fome. Semanas depois, vários milhares de estudantes concentraram-se em Tiananmen, a Praça da Paz Celestial, na China, e ao longo de 6 semanas apelaram ao início de um processo de maior abertura política por parte do governo marxista-leninista liderado por Deng Xiaoping desde a morte de Mao, em 1976. Na madrugada de 3 para 4 de Junho foram dispersados a poder de balas, tanques e blindados, contra os quais bramiram os paus que anteriormente ostentavam bandeiras e panos com gritos de liberdade, abaixo a corrupção, democracia, e tubos de tendas onde se tinham abrigado. A estátua da Deusa da Liberdade, 10 metros de papier-maché e cola, foi destruida pelos soldados como se de manteiga. Desde então que o governo chinês tem sido diligente a enterrar o "motim contra-revolucionário" - o "Liu Si" ("4 do 6"), como dizem os chineses - de Junho de 1989 e a sua mais icónica imagem: o desafiador homem apeado enfrentando os tanques. Qualquer alusão ao sucedido é censurada online e o seu autor perseguido.Badiucao, um artista dissidente chinês, é uma das vozes que está em luta contra o olvido. Através da sua arte, do uso da sátira e da cultura pop, afronta a ditadura e a censura chinesas, questionando aspectos políticos e sociais. Diz que é importante para o povo chinês, e para ele mesmo, que a história do massacre de Tiananmen e do homem dos tanques não sejam apagadas. Que todos têm o direito ao reconhecimento público das vítimas, à divulgação do número de mortos, que hoje se especula tanto poderem ser centenas como milhares, e ao julgamento dos que infringiram direitos humanos.
Uma #flag para o Twitter |
Quem se recusa a esquecer são as "Mães de Tiananmen" que se lhe referem como "o massacre de 4 de Junho". O movimento é composto por 127 mães, lideradas por Ding Zilin, hoje com 82 anos: "Não posso fechar os olhos à dor daqueles que sofreram idêntico destino. Como um grupo, eles foram esquecidos e abandonados pela sociedade. Tomei a firme decisão de continuar a minha missão de localizar e ajudar as famílias do massacre de 4 de Junho, até o próprio governo participar activamente deste projeto e não haver mais necessidade de nossos esforços." Professora universitária, foi expulsa do Partido Comunista e forçada a deixar a universidade, juntamente com o marido. As mães octogenárias são impedidas de sair de casa, vigiadas por soldados fardados ou à paisana, seguidas, e por vezes algemadas em vésperas da data para não agitaram opiniões.
A melhoria global do nível de vida da população e a ascensão da China a potência económica mundial, levou a sociedade chinesa a confiar no governo e distrai as pessoas deste facto histórico. E, sobretudo, o medo. Os familiares das vítimas foram longamente vigiados, perseguidos e silenciados. A China tem um enorme orçamento para a defesa interna que aplica no desenvolvimento de tecnologia de vigilância dos seus cidadãos. A censura digital é uma outra muralha da China. Isto, o editorial não menciona. Ajuda a este quadro que as democracias no Ocidente estejam cada vez mais convulsionadas e enfraquecidas. Apenas em Taiwan, Macau e Hong Kong surgem manifestações que recordam o protesto. As suas figuras públicas pronunciam-se a favor do arrependimento, que tarda, do partido chinês pelos erros cometidos no passado contra jovens que não consideram rebeldes, antes patriotas.
Contrastando com algumas imagens caóticas do massacre de Tiananmen, - soldados armados, ambulâncias, jovens ensanguentados, autocarros queimados, blindados a derrubar barreiras,etc - a fotografia do homem dos tanques é de uma serenidade estonteante e ao mesmo tempo de enorme angústia. Que louco seria este que não se deixou intimidar pela possibilidade de uma morte certa? Estaria tão cansado da vida que ela nada lhe importasse? Que força alimentou o seu espírito para ter a coragem de afrontar a coluna de tanques em mangas de camisa e dois sacos de compras nas mãos? O homem do tanques tornou-se imortal. Talvez até não fosse difícil enterrar um pedaço do passado não fora a existência deste homem misterioso. No Oeste a cultura popular já se apropriou da figura do homem do tanques. Ele não é mais um cidadão da China: é um herói do mundo que simboliza a luta contra o abuso de poder e pela liberdade de opinião. Além do mais, existe um vídeo e, sobretudo existe a fotografia de Jeff Widener.
Um dia depois do massacre da Praça Tiananmen, quando as tropas chinesas atacaram os manifestantes pró-democracia acampados na praça, a Associated Press enviou Widener para o local. Na manhã de 5 de Junho de 1989, ele estava empoleirado na varanda do sexto andar do Hotel Pequim. O jornalista foi até ao hotel com medo, era uma missão arriscada. Já tinha sido atacado na rua e até se retirou, não se arrependendo, acreditando que o flash da sua máquina o teria feito um alvo fácil. Viu de perto o embate de forças: uma manifestação de estudantes e civis a favor da democracia a ser esmagada pelas militares do partido único. Até hoje não se sabe quantos terão perecido.
Jeff sabia que a segurança do hotel usaria meios de danificar os equipamentos fotográficos dos jornalistas e assim escondeu tudo o melhor possível antes de entrar no Hotel Pequim. Aí encontrou, no hall, um jovem americano, de nome Rick. Identificou-se como sendo da Associated Press e pediu ajuda. Ele guiou-o até ao seu quarto, com vista para a praça. Jeff tirou fotos da janela mas precisava de mais película. Pediu ao estudante se lha conseguia arranjar, pois não se podia dar ao luxo de sair do hotel e ser descoberto. Duas ou três horas depois, o estudante regressou da rua com um rolo de filme.
Jeff sabia que a segurança do hotel usaria meios de danificar os equipamentos fotográficos dos jornalistas e assim escondeu tudo o melhor possível antes de entrar no Hotel Pequim. Aí encontrou, no hall, um jovem americano, de nome Rick. Identificou-se como sendo da Associated Press e pediu ajuda. Ele guiou-o até ao seu quarto, com vista para a praça. Jeff tirou fotos da janela mas precisava de mais película. Pediu ao estudante se lha conseguia arranjar, pois não se podia dar ao luxo de sair do hotel e ser descoberto. Duas ou três horas depois, o estudante regressou da rua com um rolo de filme.
O fotojornalista ouviu um ruído crescente na rua e pela janela observou uma coluna de tanques que se aproximava. De repente vê surgir um homem de calças e camisa que segura sacos de compras nas mãos e diz a Kirk que ele lhe vai estragar a composição. O homem tinha-se entretanto abeirado da coluna de tanques que avançava na praça. Ouve-se o ruído de armas de fogo a serem disparadas mas o homem não sai da frente do tanque. O tanque tenta contorná-lo mas ele insiste e depois trepa para cima do tanque! Finalmente é preso e levado dali. Jeff consegue fazer três fotos a partir da varanda do 6º andar e a fotografia do rebelde irá ser difundida pelo mundo inteiro, furando a censura chinesa. Especula-se até hoje acerca da identidade do homem e do seu destino.
Tiananmen tornou-se num dos símbolos maiores da luta pela democracia e direitos humanos. Trinta anos passados, a repressão da liberdade de expressão e de associação, e da liberdade de imprensa na China, continuam. A vigilância sobre activistas, sobreviventes, familiares de vítimas, advogados e jornalistas é uma realidade. A luta do homem dos tanques é a luta das mães de Tianenmen, ambos tão impotentes mas tão voluntariosos na firme recusa da arrogância e prepotência do poder.
Em Portugal, com o voto contra da bancada do PCP, a Assembleia da República aprovou esta sexta-feira dois votos de pesar em memória das vítimas de Tiananmen.
Em Portugal, com o voto contra da bancada do PCP, a Assembleia da República aprovou esta sexta-feira dois votos de pesar em memória das vítimas de Tiananmen.
In Pictures: Inflatable Tank Man sculpture appears in Taiwan ahead of Tiananmen Massacre anniversary
Trailer and Documentary China's Artful Dissident
Mysterious Chinese Political Cartoonist Badiucao Unmasked at Last
Massive crowds at Hong Kong Tiananmen vigil on 30th anniversaryMysterious Chinese Political Cartoonist Badiucao Unmasked at Last
The Tiananmen Mothers Never Forget
Unforgotten - is a series of profiles of victims of June Fourth
Tiananmen Square 30th anniversary: How China erased iconic 'tank man' image for young people
2 de Junho de 1989, um poema de Liu Xia (Poema escrito para Liu Xiaobo, que se encontrava em greve de fome na Praça, pela sua futura mulher)
Comentários
Bela homenagem, parabéns.
Posso acrescentar uma sugestão de leitura? Poesia de Liu Xia:
https://www.poetrysociety.org/psa/poetry/crossroads/own_words/Liu_Xia/
Ela tem um poema sobre Tienanmen chamado "June 2, 1989".