Se quiser falar com Deus, mande-lhe uma SMS enquanto conduz




À entrada de uma igreja encontrava-se um cartaz com a seguinte advertência:
Ao entrar nesta igreja é possível que receba um chamamento de Deus. No entanto, é improvável que Ele faça essa chamada para o seu telemóvel. Por isso, pedimos encarecidamente que o desligue.
Se quiser falar com Deus, a melhor maneira é entrar, escolher um lugar da sua preferência e muito simplesmente conversar com Ele.
 
Mas, se por acaso quiser Vê-lo, pode sempre mandar-lhe uma mensagem de texto enquanto estiver a conduzir.
Ano novo, condução nova. Que tal? Vale a pena parar e escutar a voz da razão. A sério. É que a PSP e a GNR, registaram 115 multas por dia entre Janeiro e Setembro do ano passado, diz a jornalista no video que acabei de ver. Apanharam 29.000 condutores em infracção! Fala-se até em estudar a inibição do sinal de telemóvel dos condutores! É claro que durante toda a minha infância e adolescência nunca se viu um telemóvel num automóvel e a vida corria sobre rodas. Mas nos dias de hoje, como viver sem eles? O facto é que as multas por uso do telemóvel ao volante vão de vento em poupa! Tudo começou com as conversas, depois a leitura e envio de mensagens, depois o tomar notas, pesquisar, e agora até já se vê televisão no telemóvel enquanto se conduz. O velhinho "se conduzir não beba" só aparece por ocasião das festas, a preocupação com o uso pouco cauteloso dos telemóveis roubou-lhe o protagonismo. Não admira que a Tesla queira meter os automóveis a conduzir autonomamente!

Os estudos mais loucos, desta e daquela universidade, são notícia já habitual. Quase tanto como as multas! É de tal forma que já ninguém liga a estudos "científicos". Mas, quem é que ainda não ouviu falar do estudo dos cérebros dos taxistas ingleses? O que terão os seus cérebros assim de tão especial? Antes de explicar, um aparte: um taxista londrino não é um taxista qualquer. Para obter a licença de taxista e poder conduzir um daqueles icónicos táxis negros na capital londrina, os candidatos a taxistas têm de fazer um exame: "The Knowledge" e isto significa que têm de aprender 300 percursos e 25.000 ruas, ou seja, há que decorar o A-Z de Londres, além das principais atracções turísticas, como museus, parques, igrejas, além de outros lugares de interesse para o cidadão comum, como mercados, escolas, hospitais, etc. O resultado de todo este esforça resulta na suada obtenção licença de taxista e num hipocampo direito aumentado, segundo o já famoso estudo, também londrino, de Eleanor Maguire e colegas. Esta dedicada canseira pode demorar entre 2 a 4 anos e o exame tem prova escrita e oral e não permite cábulas. Há até um documentário sobre o mais difícil exame para se ser taxista no mundo: ser taxista londrino. Estes homens não podem usar GPS nos seus carros, ao contrário dos motoristas da UBER, e isso já tem motivado protestos por acharem injusto: tenho de lhes dar razão. Os motoristas londrinos conseguem até melhores resultados que os aparelhos, aliando conhecimento e intuição para bater o trânsito congestionado. É assim que o conhecimento e experiência de navegação e orientação destes condutores londrinos não se compara à dos nossos taxistas nem, muito menos, à nossa, de comum condutor. O hipocampo é uma região do cérebro humano relacionada com a memória e a navegação espacial, sendo uma das primeiras áreas do cérebro a ser afectada pela doença de Alzheimer. Daí a razão destes particulares cérebros terem sido estudados.

Ora, estudos efectuados aos montes, a sério, são imensos, demonstram que usar o telemóvel e conduzir ao mesmo tempo implica uma sobrecarga mental acrescida que prejudica a realização segura da tarefa da condução. O risco de colisão aumenta quatro vezes! (Olha o estudo!) O nosso cérebro é incapaz de atender satisfatoriamente a duas tarefas diferentes realizadas simultaneamente. Mulheres, esqueçam a ideia de que a vantagem no multitasking vos favorecerá, e, aliás parece que já foi desmentida uma falsa notícia a favor da tese originada num estudo  que algum jornalista tresleu. É mais um  mito,  e o que se aconselha a todos, homens e mulheres, é a trabalharem sequencialmente, para obterem os melhores resultados.

Um psicólogo cognitivo de nome George Miller já em 1956 tinha chegado à conclusão de que apenas conseguimos manejar sete, mais ou menos dois, "segmentos" de informação ao mesmo tempo. (Nome do estudo- O número mágico sete, mais ou menos dois: Alguns limites na nossa capacidade de processar informação.) Ou seja, a actividade da memória (memória de trabalho)  tem uma capacidade limitada. Por isso, não inventem super-poderes. Pode correr mal, pode ser só chapa, e já não é bom, ou pode ser pior.

Basicamente o uso do telemóvel compromete a nossa capacidade de vigilância porque a nossa atenção tem se repartir por vários focos em vez de se concentrar no trânsito. É tão elementar que custa a levar a sério. Dizem que a própria conversa já é um factor de distracção por si só, pelo que embora o uso de um sistema"kit mãos livres" permita manter as 2 mãos no volante, reduzindo alguns riscos, não resolve tudo. Somos muito permeáveis à distracção. Há uma experiência, a experiência do gorila invisível, que atesta isso mesmo. 

Imagine que o convidavam para ver um video no qual seis pessoas - três em camisa branca e três em camisa preta - jogam basket, e lhe pediam que fizesse a contagem silenciosa do número de passes feitos pelas pessoas em camisa branca. Diria que isso era fácil. E se algures no video um gorila aparecesse no meio do jogo, encarasse a câmara e batesse no peito, saindo, depois, passados nove segundos? Você teria a certeza que não deixaria de o ver. Juraria a pés juntos que sim, que seria fácil. Só que talvez não fosse bem assim. A experiência foi feita na Universidade de Harvard, há alguns anos, e metade das pessoas que assistiram ao vídeo e contaram os passes não viram o gorila: era como se o gorila fosse invisível.

O aconselhável é, portanto, que o condutor - incluindo o ciclista, e também o peão, que já tenho visto a atravessar a rua a olhar para o instrumento! - evite usar o telemóvel, seja qual for a sua forma de utilização, durante o acto de condução. Se de todo não for capaz, bem, é melhor chamar um táxi!

O que pode acontecer assim de tão errado? É, realmente, difícil aceitar que não consigamos dar conta de dois recados ao mesmo tempo. Mas a psicologia aconselha-nos a desconfiar da nossa confiança pois medimos muito mal o risco e desvalorizamos o perigo. Desde logo, o tempo de reacção aumenta, e, só por isso, uma situação antes controlável pode tornar-se perigosa: um peão que se atravessa na estrada, um cão imprevisível, uma moto vinda de nenhures. É mais complicado ajustar a distância em relação a veículo que circula à frente. É mais difícil descodificar sinais de trânsito, placas informativas. Se já somos preguiçosos a sinalizar mudança de direcção, de telemóvel em punho ela não se vai fazer. A visão periférica e a informação visual recolhida através dos retrovisores é prejudicada: o olhar perde mobilidade, foca-se na zona frontal. A conversa pode levar a excitabilidade diversa em função do seu teor. Usar o telemóvel pode revelar-se mais prejudicial se estiver a chover, se o trânsito for intenso, etc.

E, claro, podemos ser multados por usar o telemóvel durante a condução. Mas, atenção, se pararmos para o utilizar também podemos ser multados. E que tal ter algum amor, se não à nossa vida e à vida dos outros, ao lindo dinheirinho que tanto nos custa a ganhar? A multa para os condutores apanhados a conduzir e a falar ao telemóvel vai de 120 a 600 euros, de acordo com o artigo 84.º do Código de Estrada, Lei n.72/2013 de 3 de Setembro:

- É proibida ao condutor, durante a marcha do veículo, a utilização ou o manuseamento de forma continuada de qualquer tipo de equipamento ou aparelho suscetível de prejudicar a condução, designadamente auscultadores sonoros e aparelhos radiotelefónicos, com a exceção dos aparelhos dotados de um único auricular ou microfone com sistema de alta voz, cuja utilização não implique manuseamento continuado. 

E trata-se de uma contra-ordenação grave, de acordo com o art.145º, perde-se 2 pontos na carta, podendo resultar na inibição de conduzir de 1 mês a 1 ano:

n) A utilização, durante a marcha do veículo, de auscultadores sonoros e de aparelhos radiotelefónicos, salvo nas condições previstas no n.º 2 do artigo 84.º (aparelhos dotados de um único auricular ou microfone com sistema de alta voz, cuja utilização não implique manuseamento continuado).

O Código diz que durante a marcha não podemos usar o telemóvel. Mas não estar em marcha não significa que não existam multas de condutores que estavam parados de telemóvel em punho ou mesmo com o kit mãos livres: é o Código da Estrada, não o Dicionário Priberam. A coisa requer alguns cuidados de interpretação. Os condutores podem usar o telemóvel sem meios adicionais se estiverem estacionados ou parados - nunca durante a marcha - e não causarem perigo ou embaraço para os outros utentes da via. Durante a marcha é permitido o uso de um único auricular ou microfone com sistema de alta voz, cuja utilização não implique manuseamento continuado. Evite sempre o manuseio do seu telemóvel. E cuidado ainda no momento em que se decida parar ou estacionar não vá a urgência toldar o discernimento e acaba-se multado por ter parado ou estacionado num local proibido.

Divulgue, por um novo ano mais seguro na estrada e com menos multas!

O que diz o Código da Estrada:

Artigo 84.º - Proibição de utilização de certos aparelhos

1 — É proibido ao condutor utilizar, durante a marcha do veículo, qualquer tipo de auscultadores sonoros e de aparelhos radiotelefónicos.
2 — Exceptuam-se do número anterior:
a) Os aparelhos dotados de um auricular ou de microfone com sistema alta voz, cuja utilização não implique manuseamento continuado;

Paragem e estacionamento 

Artigo 48.º 
Como devem efetuar-se 
1 - Considera-se paragem a imobilização de um veículo pelo tempo estritamente necessário para a entrada ou saída de passageiros ou para breves operações de carga ou descarga, desde que o condutor esteja pronto a retomar a marcha e o faça sempre que estiver a impedir ou a dificultar a passagem de outros veículos.
 2 - Considera-se estacionamento a imobilização de um veículo que não constitua paragem e que não seja motivada por circunstâncias próprias da circulação. 

Artigo 49.º - Proibição de paragem ou estacionamento

 1 - É proibido parar ou estacionar:
 aa) Nas rotundas, pontes, túneis, passagens de nível, passagens inferiores ou superiores e em todos os lugares de visibilidade insuficiente; 
bb) A menos de 5 m para um e outro lado dos cruzamentos, entroncamentos ou rotundas, sem prejuízo do disposto na alínea e)do presente número e na alínea a) do n.º 2;
 cc) A menos de 5 m para a frente e 25 m para trás dos sinais indicativos da paragem dos veículos de transporte coletivo de passageiros ou a menos de 6 m para trás daqueles sinais quando os referidos veículos transitem sobre carris; 
dd) A menos de 5 m antes e nas passagens assinaladas para a travessia de peões ou de velocípedes; ee) A menos de 20 m antes dos sinais verticais ou luminosos se a altura dos veículos, incluindo a respetiva carga, os encobrir; f
f) Nas pistas de velocípedes, nos ilhéus direcionais, nas placas centrais das rotundas, nos passeios e demais locais destinados ao trânsito de peões; 
gg) Na faixa de rodagem sempre que esteja sinalizada com linha longitudinal contínua e a distância entre esta e o veículo seja inferior a 3 m. 
2 - Fora das localidades, é ainda proibido: 
aa) Parar ou estacionar a menos de 50 m para um e outro lado dos cruzamentos, entroncamentos, rotundas, curvas ou lombas de visibilidade reduzida; 
bb) Estacionar nas faixas de rodagem; 
cc) Parar na faixa de rodagem, salvo nas condições previstas no n.º 3 do artigo anterior. 

Artigo 50.º Proibição de estacionamento

 1 - É proibido o estacionamento: 
aa) Impedindo o trânsito de veículos ou obrigando à utilização da parte da faixa de rodagem destinada ao sentido contrário, conforme o trânsito se faça num ou em dois sentidos; 
bb) Nas faixas de rodagem, em segunda fila, e em todos os lugares em que impeça o acesso a veículos devidamente estacionados, a saída destes ou a ocupação de lugares vagos; 
cc) Nos lugares por onde se faça o acesso de pessoas ou veículos a propriedades, a parques ou a lugares de estacionamento; 
dd) A menos de 10 m para um e outro lado das passagens de nível;
 ee) A menos de 5 m para um e outro lado dos postos de abastecimento de combustíveis; 
ff) Nos locais reservados, mediante sinalização, ao estacionamento de determinados veículos;
 gg) De veículos agrícolas, máquinas industriais, reboques ou semirreboques quando não atrelados ao veículo trator, salvo nos parques de estacionamento especialmente destinados a esse efeito; 
hh) Nas zonas de estacionamento de duração limitada quando não for cumprido o respetivo regulamento; 
ii) De veículos ostentando qualquer  informação com vista à sua transação, em parques de estacionamento.

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