Joana Amaral Dias na capa da revista Cristina


É um assunto já meio enterrado. Mas ainda tropeço em algumas opiniões sobre a mais recente capa da revista cor-de-rosa Cristina.E é assim porque as pessoas são livres de fazer tudo. São tão livres de tirar fotos como outras de comentar as fotos tiradas. E outras de comentar os comentários feitos. Anda tudo num comentatório pegado. Porque se não comentarmos o mundo pós web2.0 não roda.

Joana Amaral também comentou os comentários mostrando-se chocada pelo seu teor, um rol mimado de lamúrias ou a sua legítima defesa, entendam como quiserem. Tem tido uns dias difíceis, a moça, mas está muito sensibilizada pelo apoio de quem apoia. Evidentemente, quem anda à chuva molha-se, em especial se andar despido. Se não queria ter de lidar com os comentários às respectivas fotos, não fazia as fotos. É apenas ingénuo pensar que quem faz fotos que são reproduzidas em revistas ou qualquer espaço público se vai livrar de comentários, positivos ou negativos. Em especial se é uma figura pública. A capa de uma revista destas é entretenimento de massas.Do barato. E ela devia saber, aliás, sabe,tudo faz parte da encenação, que uns iam aplaudir e outros fazer pateada.

Ah, a Joana e o gajo dela estão felizes e quiseram partilhar essa felicidade, dizem uns. Vocês são mesmo insensíveis,o amor é lindo, dizem outros. As melhores intenções nem sempre justificam os actos. As pessoas podem fazer tudo e para tudo vão sempre ser encontradas justificações. A bomba atómica foi justificada para alguém que deu ordens para ela ser lançada. Eu acho que foi um crime.Exemplo extremo, eu sei. Mas repare-se numa coisa. Eu vi a foto e num relance achei a foto gira. Todavia, eu não concordo com aquele tipo de exposição. Não tem a ver com preconceitos disto e daquilo. Dela estar grávida, dela ser mulher, dela ser política. Eu apenas acho que aquela intimidade devia ser preservada dos olhares alheios.Não é só a gravidez, é a relação. Isso interessa a quem? A mim? É uma coisa deles. Entendo-a como um privilégio, deles, que eles deviam cuidar e não expor ao escrutínio público. Se assim fosse as pessoas - quando casam pela igreja ou pelo civil, ou quando se juntam, e sejam ricos, pobres, estrelas de cinema ou anónimos ilustres - convidavam a aldeia, a vila, o bairro, os amigos do Facebook. É assim? Não. As pessoas rodeiam-se nesse momento significativo daquelas com quem criaram laços.Por isso, sim, as pessoas são livres, mas os seus actos têm consequências e elas nem sempre são as esperadas ou as desejadas. Actualmente não há mais intimidade, coisas privadas, exclusivas.

Este episódio não passa de mais um exemplo da nossa sociedade espectáculo. Tudo é show, reality show.Tudo é público. Eu não concordo com isso, a imensos níveis. É excessivo. Eu sei que é uma coisa cultural. Acho que era o Rei Luis XIV que recebia os convidados enquanto defecava. E estava tudo bem. Os tempos mudam. Coisas como a intimidade ou o pudor estão sujeitos à modulação dos tempos, da cultura, da moral, muitos factores interferem nas nossas convições. Pessoalizando, eu gostava de ter uma foto daquelas, na minha casa, partilhá-la com as pessoas de quem eu gosto, que me estimam. Não seria capaz de a meter nunca capa de uma revisteca qualquer e saber que vão acabar no contentor dos reciclados. Por conseguinte não percebo por que razão eu sou considerada preconceituosa, atrasada, pidesca por me armar em censora, alguns entre tantos adjectivos com que os mais tolerantes, visionários, avançados, vanguardistas, amantes da liberdade e da emancipação feminina, humana ou outra qualquer, acham por bem rotular-me. Eu nunca impediria a rapariga de fazer a foto, mesmo se não acho a ideia feliz. Nem deixaria de votar Agir embora também não fosse votar por causa da foto...! Mas para alguns devotos eu é que tenho de me despir de preconceitos, a Joana está coberta de sensatez. É um assunto que não demora está esquecido e que vale tanto quanto vale uma foto qualquer numa capa de revista, ou seja, não vale muito. E mesmo assim aqui estamos entregues ao comentatório generalizado de uma foto sem grande história, algo está enviesado nas nossas prioridades.

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