Extinguir feriados em Portugal para melhorar a produtividade




Hoje, um dia que até começou a brilhar, para terminar embrulhado em névoas e frio, foi feriado em Portugal. Ainda espreitei pela janela, a ver se o D. Sebastião aparecia pelo fim da tarde, mas não. O dia 1 de Dezembro é o Dia da Restauração da Independência. E o que é que foi isso? O Rei D. Sebastião morreu na batalha de Alcácer-Quibir, no norte de África, novo e sem descendência. Não havia cabeças para usar a coroa portuguesa e ainda não se tinha inventado a República pelo que não se podia chamar o povo a votos para meter lá um fdp qualquer. Quem foi sentar o rabiosque no trono foi o Cardeal D. Henrique, que era tio-avô de D. Sebastião. Mas não chegou a aquecer o lugar. Bastaram dois anos e já todos diziam que não servia e candidatos ao poiso eram mais do que as mães. Vieram as Cortes de Tomar e surge Filipe II todo lampeiro. Ele era neto do rei D. Manuel e por isso ainda podia reclamar o assento real. E pimbas. De Espanha nem bom vento, nem bom casamento, mas a verdade é que as alianças entre tugas a espanholos até eram frequentes à época, muito antes de Saramago e Pilar se terem encantado e dado o nó. E foi assim que de um momento para o outro ficamos sob a patorra dos Filipes – I,II,III e IV. Foi um "dois em um" à maneira, Portugal e Espanha eram dois corpos mas uma só cabeça coroada. Como muitos casamentos, os primeiros anos desta união ibérica até correram mais ou menos, mas depois acabou-se o mar de rosas. Não sei já o que se passou, teria de ir consultar os livros, o Google. Mas não vou, vão vocês ou então imaginem. Depois do golpe que derrubou o regime filipino entrou D. João IV ao serviço e Portugal voltou a ser Portugal, e Espanha tornou a ser a Espanha, ficassem lá com as paellas, que por cá a gente prefere outras iguarias, por exemplo uma pratada de bom bacalhau à Zé do Pipo. E não pensem que isto aconteceu num abrir e fechar de olhos, não, tivemos que amargar 70 anos de paellas.

Muitos séculos depois, muitas comemorações da Restauração passadas, em 2010 começaram a germinar as ideias para acabar com os feriados civis e católicos, um projecto de resolução apresentado pelas deputadas católicas independentes eleitas pelo PS, Teresa Venda e Maria do Rosário Carneiro. As senhoras queriam eliminar quatro feriados e transferir os outros de forma a inviabilizar as “pontes”. Menos pontes, maior produtividade. O tempo passou e agora a discussão da extinção dos feriados está bem encalorada, são quase tantas as sentenças sobre a questão quantos outrora foram os pretendentes ao lugar do Cardeal D. Henrique! Uns defendem o fim do 1º de Maio, outros o do 25 de Abril, outros acham a ideia de mexer nos feriados pura e simplesmente infeliz.

O Governo de Passos Coelho anda em conversações com os parceiros sociais e a proposta é acabar com a comemoração do 1º de Dezembro e também com o 5 de Outubro, que celebra a Implantação da República. A Igreja também anda a ver o que pode fazer: na calha para a extinção estão o 5 de Agosto, festa da Assunção de Nossa Senhora e o feriado do Corpo de Deus, um feriado móvel que calha sempre a uma quinta-feira depois do Domingo da Santíssima Trindade que, por sua vez, tem lugar na semana depois de Pentecostes. Mas a Igreja ainda tem de ir conferenciar com o Vaticano, não se pode varrer assim um feriado ou dois para debaixo do tapete de qualquer maneira. Portugal nomeará um embaixador e depois este irá ao Vaticano, etc e tal, até parece que estamos no tempo dos Filipes, caramba, o Vaticano não tem internet? Não se podem acabar com os feriados por tele-conferência? Pelos vistos não.





Pessoalmente, concordaria mais facilmente com a extinção do 1º de Maio do que com a extinção do feriado que hoje se assinala. Os factos que originaram a comemoração do Dia do Trabalhador são em relação aos portugueses uma memória cultural internacional, não têm justificação em acontecimentos de teor nacional, como é o caso da Restauração da Independência. (Já meti os meus leitores de esquerda aos refofes depois disto, amanhã já tenho menos subscritores no feed.)Para mim está na mesma prateleira que um Dia Mundial do Ambiente. Não me venham dizer que o trabalho é mais importante que a preservação do ambiente. Quer dizer, digam-no, se quiserem, afinal anda tudo a manifestar-se, as pessoas descobriram agora que os feriados são bué de importantes! O mais curioso é que nesses importantíssimos dias feriados não se vê ninguêm a festejá-los. Se é inverno as famílias vão todas ao hipermercado nesses famosos dias, se é Verão vão despreocupadas para a praia. Exemplo: chega o famoso Dia de Camões, de Portugal e das Comunidades e quem o assinala são os emigrantes por esse mundo fora. Cá dentro apenas os suspeitos do costume se manifestam: o Presidente da República lá vai à Sessão Solene da praxe onde distribui condecorações a um conjunto de personalidades e instituições, lê um discurso, assiste a umas paradas, os presentes têm todos cara de quem está a fazer um grande frete, é mais um enterro do que uma festa. Em contrapartida, e em virtude dos meus contactos com americanos, vejo que eles festejam o seu 4 de Julho de uma forma tão exaltada que até parece palerma!Confesso que tenho inveja dessa exteriorização ruidosa, em tons de vermelho e azul, que enche as ruas e suas casas de alegria motivada por um sentimento patriótico que, nós, portugueses, ou já não temos ou já não sabemos exibir. Até parece que temos vergonha de celebrar a Pátria. Por coincidência recebi o video acima há uma hora atrás. Não desistas, por Portugal. Depois disso resolvi celebrar o 1º de Dezembro com esta postagem. Quem sabe no próximo ano já não tenho feriado.

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