Cinema: As crianças perdidas da África do Sul



Desde há uns meses a esta parte que tentei, sem grande êxito, cativar artistas plásticos e artesãos para colaborarem numa acção de angariação de fundos a favor de crianças sexualmente abusadas na África do Sul. A organizadora é uma artista plástica irlandesa, eu não a conheço pessoalmente, mas vi o apelo dela e oferecei-me para divulgar também junto dos potenciais interessados de língua portuguesa a exposição Faces of Africa. O evento vai acontecer em Novembro e até final deste mês ainda é possível enviar trabalhos.

Fiquei decepcionada com a falta de receptividade das pessoas. Não sei se é por todos atravessarmos momentos difíceis ou se por acharem que as nossas crianças estão primeiro e que é para elas que devemos canalizar os nossos esforços solidários, ou se por mera insensibilidade perante um problema dos outros, problema que sabe bem melhor tentar ignorar do que encarar, ou se por desconhecimento da realidade que se vive na África do Sul. Cada um de nós pode fazer pouco, muito pouco. Mas as ajudas somadas podem efectivamente ter algum impacto, eu acredito nisso. A minha adesão ao projecto da Rosetta Jallow não precisou de grande reflexão. Os trabalhos que enviei são simples mas tentei dar o meu melhor e estou satisfeita por ter contribuído pois se se venderem a Rosetta poderá enviar mais dinheiro para África do que aquele que eu poderia doar.

Na altura da minha decisão não tinha ainda visto este documentário que posteriormente encontrei no Youtube. Perante o relato das crianças, familiares e técnicos sociais que vemos no filme pergunto-me como pode o mundo fechar os olhos a esta situação, pergunto-me se todos os que contactei fazem ideia daquilo que está em causa. É pior do que imaginava. As crianças da África do Sul enfrentam a pobreza, a epidemia do HIV/SIDA, a violência de género. Os habitantes do país subsistem na sua maioria com menos de 1 dólar por dia. As mulheres em idade fértil são as mais afectadas pelo HIV/SIDA e isso agrava substancialmente a condição das crianças. Muitas ficam orfãs e assim ficam ainda mais expostos a todo o género de violência. As taxas de criminalidade são das mais elevadas no mundo. Ali uma mulher tem mais hipóteses de ser violada do que aprender a ler, diz-se. Cerca de 1300 mulheres serão violadas diariamente e este número não inclui as crianças. O abuso sexual infantil é calamitoso - as próprias crianças acham que a violação em grupo é divertida, chamam-lhe jackrolling. As violações começam antes dos sete anos de idade, verdade, leu bem. Existem bebés de meses a serem submetidos a cirurgias reconstrutivas depois de terem sido abusadas. Existe ainda a convição generalizada de que as vítimas gostam de ser violadas e de que ter relações sexuais com uma virgem cura o HIV/SIDA. Uma coisa é lermos estes e outros factos, outra é ouvirmos e vermos os envolvidos. Os direitos humanos dizem respeito a todos nós.

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