Zapping: quem vê TV sofre mais que no WC

Ontem, eis que depois de um belo copo de vinho e de um jantar quase vegetariano me instalo no conforto do sofá para descansar a cabeça dos enovelados e malucos pensamentos do dia. Se fosse só isso até talvez desse bom resultado. Mas perto de um sofá fofo não raras vezes anda um comando de TV que a nossa mão teima em ir buscar como quando o coçar chama por unhas! E vai daí lá começo eu a percorrer os canais. Num deles um documentário já adiantado sobre a pele, a nossa pele, e então apenas consigo perceber que numa tribo qualquer existe um ritual de iniciação em que os rapazes andam às cambalhotas por cima de uma manada de bois chifrudos, ou algo assim, mas, se por azar do destino tiverem irmãs, enquanto os irmãos se submetem às marradas, elas são chicoteadas pelos homens da tribo. A pele negra das costas fica cortada, o sangue jorra e depois elas ostentam orgulhosamente as cicatrizes. É assim que os rapazes passam a homenzinhos, daí para a frente são considerados casadoiros, isso é claro, se algum dos bois não lhes der cabo do material. 

Os jornalistas estavam impressionados com a quantidade de dor implícita na festa. Eu também. De seguida o grupo visado são os gangs americanos, uns tais Asian Boys que se divertem a roubar carros, a traficar droga, enfim, brincadeiras juvenis próprias de rapazolas na idade civilizada do nosso século. Nos intervalos da diversão eles fazem-se mutuamente tatuagens e para isso, diz o narrador, apenas precisam de uma lapiseira, de uma corda de guitarra e de uma bateria. Eu fiquei a matutar no método artesanal já que eles não explicitaram a arte da tatuagem improvisada. E eu, quem costuma espreitar o meu blogue, sabe que eu gosto de tatuagens. No Algarve deu para perceber que não sou só eu, aquilo veio para ficar entre os ocidentais. Depois era a história de um ex-gang boy que queria mudar de vida mas que tinha a sua história/vocação escrita no corpo, era complicado, todos o julgavam perigoso. 

Para quem queria descansar, eu não estava a ficar nada relaxada. Então mudei de canal e desta vez apanhei uns videos com o Timbaland. Não cesso de me pasmar com a versatilidade e omnipresença deste produtor,cantor...whatever!Ele está em todas! E a qualidade do que faz é aceitável e mais ou menos constante. Bom, durou pouco e eu mudei para novo canal e fiquei a pasmar ao som da Jennifer Lopez. Ora era mesmo isso que o meu corpo, mente e estado de sofá pediam: música ligeira sobre a boa vida, o bom humor, os amores felizes, let’s get loud,etc,etc. Para variar neste conjunto de videos o que se faz é o elogio da pele perfeita: sã, macia, lisa, elástica, sem mácula, muitos centímetros quadrados de pele gulosa. Mas isso acabou e lá tive eu de dar ao dedo. Desta vez surgem as histórias de três jovens americanas problemáticas. Apesar de parecerem bastante normais, de trabalharem, de estarem inseridas na sociedade americana e tal, duas delas automutilam-se fruto de traumas diversos, cortam-se com lâminas nos braços, na barriga,sangue a pingar, infecções, hospital, cicatrizes, sofrem tanto psicologicamente que só a dor física lhes transmite alívio...porra!Será que as televisões se combinaram no alinhamento?!!O caso da terceira jovem até dava vontade de rir se não fosse igualmente dramático: arrancava cabelo e fazia peladas enormes na cabeça, tudo fruto da ansiedade. Não satisfeita com isso, contava os cabelos arrancados. Na sessão mostrada com a sua terapeuta levou-os numa saca plástica: eram 506!!!(Por acaso também arrancava pelos púbicos, mas isto é só um pormenor.) Lembrei-me de uma amiga minha do tempo da faculdade que enquanto estudava estava sempre de tesoura em punho e ia cortando pontas espigadas..mas um dia arrancou meia sobrancelha e nos tempos seguintes, enquantos os pelitos não cresciam, usava um band aid e dizia a todos que “tinha dado um toque”!!!

Ora quando eu penso que sou maluca em virtude das escolhas que faço para a minha vida o que eu preciso é de ligar a TV para ver como há gente mais maluca do que eu, e, infelizmente, a lutar desesperadamente contra uma maluquice que não controla, pois cá eu ainda vou mantendo a minha dentro dos limites da minha ténue consciência. Exausta, desliguei o aparelho e fui revisitar o som de Smoke City. Ufff, que alívio!(Ah, a fotografia do protagonista de Prison Break, pois é.O que faz ela ali?Ando sempre à procura de desculpas para meter o W. Miller neste blogue, já devem ter percebido isso... e este postagem é apenas mais uma!)

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